A 16 de dezembro Donald Trump ordenou o “bloqueio total dos petroleiros sancionados que entrem e saiam da Venezuela”. Com isto, o ultrareacionário presidente estado-unidense refere-se à frota de petroleiros de grande capacidade que transportam petróleo da Venezuela para a China sob bandeiras de diferentes países, burlando as sanções impostas pelo imperialismo estado-unidense. Estes petroleiros representam uma parte significativa das exportações de que depende a economia venezuelana.

Num tom totalmente depreciativo e insultuoso para com o povo venezuelano, este imperialista racista e supremacista proferiu um discurso selvagem que faz lembrar os períodos mais brutais da “política do grande garrote” e da Doutrina Monroe. Quando Washington se declarava dono de todo o continente americano, considerando cada país como parte do seu “quintal”, fazendo e desfazendo a seu bel-prazer através de invasões, guerras, golpes de Estado e bloqueios navais. Tal como pretendem voltar a fazer agora!

Trump declarou o petróleo venezuelano — que foi saqueado impunemente durante décadas pelas petrolíferas ianques, até ao início da revolução bolivariana em 1998 liderada por Hugo Chávez — propriedade dos Estados Unidos. E exige que “a Venezuela devolva o petróleo que nos roubaram”. O mundo ao contrário!

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Trump proferiu um discurso selvagem que lembra os tempos mais brutais da “política do grande garrote” e da Doutrina Monroe.

Esta nova agressão ocorre após o sequestro de um desses grandes petroleiros, no passado dia 10 de dezembro, e a atribuição no mesmo dia do Prémio Nobel da Paz à sua marioneta venezuelana, María Corina Machado, que Trump promove para liderar uma mudança de regime em Caracas, e após a decisão de 29 de novembro de decretar o encerramento do espaço aéreo, violando a soberania nacional da Venezuela e todas as normas internacionais. Uma decisão acatada de imediato e sem protestos pelas principais companhias aéreas internacionais, com o beneplácito dos governos capitalistas europeus e de outros países, que cortou quase totalmente o transporte de passageiros e mercadorias para o país latino-americano.

Todas estas medidas elevam a um ponto crítico esta nova escalada imperialista, deixando claro que Trump está disposto a tudo para impor os seus planos imperialistas e militaristas, começando por asfixiar economicamente o povo venezuelano, semear o caos e o pânico e forçar uma mudança de regime a qualquer custo, através de um golpe militar que derrube Nicolás Maduro e, se necessário, arrasando e massacrando o país. O seu objetivo é retomar o controlo das suas reservas petrolíferas, as maiores do planeta, a sangue e fogo.

A senadora republicana pela Flórida María Elvira Salazar explicou-o de forma clara no canal de extrema-direita Fox Business: “A Venezuela será um festim para as petrolíferas estado-unidenses (…) Há uma enorme oportunidade de negócio para as energéticas dos Estados Unidos. Falamos de mais de um bilião de dólares de potencial económico e as empresas estado-unidenses devem ter a sua fatia deste bolo”.

A “luta contra o narcotráfico”, pretexto para mais uma agressão imperialista

A ofensiva começou a 20 de agosto com o destacamento, no Mar das Caraíbas, ao largo da costa venezuelana, de vários navios de guerra, incluindo porta-aviões e submarinos nucleares. Desde então, os efectivos militares mobilizados passaram de 4.500 para mais de 15.000, incluindo o porta-aviões USS Gerald Ford, o maior do mundo, com mais de 4.000 fuzileiros navais a bordo.

Segundo a própria Casa Branca, o exército estado-unidense já destruiu 17 lanchas venezuelanas, colombianas e da vizinha Trinidad e Tobago, e assassinou 66 pessoas. Associações de direitos humanos e os governos venezuelano e colombiano elevam este número para mais de 20 lanchas e 83 mortos. Na sua esmagadora maioria trata-se de pescadores totalmente indefesos, executados extrajudicialmente, acusados de ligações ao narcotráfico sem qualquer tipo de provas. As suas famílias denunciam cenas aterradoras de restos mortais a chegar às praias, enquanto Donald Trump faz piadas, celebrando cada um destes crimes como uma vitória.

Enquanto anunciava a sua decisão de encerrar o tráfego aéreo venezuelano, Trump reconhecia ter dado à CIA a ordem para executar operações encobertas em solo venezuelano e ameaçava transferir estes ataques marítimos para terra e bombardear territórios fronteiriços entre a Colômbia e a Venezuela. A cortina de fumo para justificar toda esta barbárie é acusar, sem qualquer prova, o presidente Nicolás Maduro de liderar o alegado Cartel dos Sóis, cuja existência é negada por todos os investigadores sérios.

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O encerramento do espaço aéreo representa uma agressão imperialista que viola a soberania nacional venezuelana e eleva até um ponto crítico os ataques dos EUA.

Os próprios relatórios da DEA demonstram a falsidade destas acusações. A rota do fentanilo e 80% da cocaína para os Estados Unidos não passa pela Venezuela, mas sim pelo Pacífico, a partir de países com governos aliados de Trump, como o Peru e o Equador. Washington tem sido apontada durante décadas como cúmplice e protectora do narcotráfico, utilizando os cartéis e os seus bandos paramilitares para combater a esquerda e os movimentos revolucionários do continente.

Desde o financiamento da Contra para sabotar a revolução sandinista, com dinheiro proveniente da venda de crack, a CIA e os seus peões da extrema-direita latino-americana têm um longo historial de colaboração com os grandes barões e organizações do narcotráfico, fundamentais para sustentar o paramilitarismo na Colômbia, cujas redes se estendem ao aparelho policial, militar e judicial desse país e a reconhecidos representantes da classe dominante, como ficou provado no julgamento contra o ex-presidente colombiano e conhecido trumpista Álvaro Uribe.

Embora existam centenas de denúncias, e até sentenças transitadas em julgado, que ligam diferentes bancos estado-unidenses ao financiamento e branqueamento de capitais do narcotráfico, nenhum dos seus dirigentes foi preso. A absoluta impudência desta estratégia política ficou patente no próprio dia 28 de novembro. Enquanto ameaça a Venezuela, Trump anunciou o indulto a José Orlando Hernández, ex-presidente hondurenho e fundador do Partido Nacional de extrema-direita. Este indivíduo está condenado a 45 anos de prisão nos Estados Unidos por liderar um dos principais cartéis centro-americanos da droga, além de ser instigador da repressão sangrenta contra centenas de activistas de esquerda.

Todo este cínico embuste visa apenas desviar a atenção dos verdadeiros objectivos de Trump: recuperar áreas de influência e posições para o imperialismo dos Estados Unidos e as suas multinacionais numa região que consideram o seu quintal e onde actuaram com total impunidade durante décadas, organizando golpes de Estado e impondo regimes ditatoriais que custaram centenas de milhares de vidas.

Como explicámos noutros artigos, os Estados Unidos viram a sua supremacia no continente ameaçada pela ascensão fulgurante da China, principal parceiro comercial do conjunto da América do Sul, que substituiu os EUA em países-chave, começando pela principal economia continental, o Brasil, e seguindo-se o Chile e até o Peru ou a Argentina, cujos governos são aliados de Washington, mas mantêm importantes acordos comerciais com Pequim.

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Washington é cúmplice dos cartéis e das suas bandas paramilitares, utilizando-os para combater a esquerda do continente.

Venezuela, peça-chave no “jogo imperialista”

A Venezuela dispõe das reservas comprovadas de petróleo mais importantes do planeta, possui importantes jazidas de ouro e outros minerais, bem como abundantes recursos hídricos. Além disso, o regime de Nicolás Maduro é o aliado político e económico regional mais sólido da China e da Rússia. O petróleo venezuelano, que durante um século teve os Estados Unidos como principal destino, segue hoje em 85% para a China. A Rússia é o seu principal fornecedor militar. As empresas chinesas, russas e iranianas também têm vindo a ganhar, cada vez mais, quota de mercado às estado-unidenses.

Trump quer recuperar poder e influência na Venezuela e no conjunto da América Latina e enviar uma mensagem ao mundo: antes de perderem a supremacia, estão dispostos a semear a guerra e a barbárie. Deixaram-no bem claro com o seu apoio ao genocídio sionista em Gaza.

Um primeiro objectivo para vergarem o regime de Maduro é estrangular ainda mais a já castigada economia venezuelana — alvo de sanções desde o governo de Obama — semeando um clima de incerteza e pânico entre a população que abra uma brecha na cúpula militar. Mas o alto Estado-Maior do exército, da armada e da força aérea, para já, está com Maduro e com a sua política de estreitar relações com a China e a Rússia. É igualmente evidente que a sua marioneta venezuelana, a ultrareacionária María Corina Machado, também não conseguiu levantar um movimento massivo de oposição nas ruas.

O apoio de Pequim e Moscovo tem sido fundamental para que os militares tenham sustentado Maduro face a todas as investidas dos EUA: a cúpula militar participa directamente em muitas empresas mistas criadas pelo Estado com capitalistas chineses e russos.

Mas há mais factores que reforçam esta aliança. Uma parte importante do empresariado venezuelano — não apenas a “boliburguesia” surgida da burocracia do Estado, mas também a burguesia tradicional que odiava mortalmente Hugo Chávez e organizou todo o tipo de sabotagens e tentativas de o assassinar — está a fazer bons negócios com as políticas capitalistas do regime madurista e os seus acordos com Xi Jinping e Vladimir Putin.

Trump está a forçar a máquina bélica para romper estes laços. Não se pode permitir que esta aliança económica e política se consolide sem mais, num país decisivo para as suas aspirações imperialistas. Por isso, aposta em combinar ameaças militares cada vez mais directas com referências genéricas ao “diálogo”. Mas, até agora, não conseguiu abrir (pelo menos publicamente) uma brecha no seio do regime madurista, que respondeu com a mobilização de várias dezenas de milhares de soldados e reservistas e com avisos de colocar todo o país em pé de guerra, acompanhados de concessões verbais a algumas das exigências de Trump.

Após as primeiras ameaças de Trump, em Fevereiro, Maduro libertou vários golpistas venezuelanos e agentes dos serviços secretos estado-unidenses implicados em acções terroristas que custaram dezenas de vidas. Aceitou igualmente imposições relativas aos migrantes venezuelanos deportados e concedeu a exploração de algumas das jazidas petrolíferas mais rentáveis à multinacional norte-americana Chevron. Mas nada disto acalmou a Administração dos Estados Unidos.

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O apoio de Pequim e Moscovo tem sido fundamental para que os militares continuem a apoiar Maduro.

Tambores de guerra

Esta mesma semana, a frota de guerra enviada por Donald Trump impediu a chegada às costas venezuelanas de um cargueiro russo com nafta, necessária para transformar o petróleo venezuelano em gasolina e manter o abastecimento de combustíveis. Por fim, a nafta foi vendida pela empresa estado-unidense Chevron.

A possibilidade de Trump se poder contentar com concessões deste tipo não é nada clara. A situação é muito volátil e ele está decidido a demonstrar força. Os avanços que a sua Administração alcançou com Daniel Noboa no Equador, com Javier Milei na Argentina, a vitória da direita na Bolívia e o triunfo da extrema-direita nas presidenciais do Chile estão a encorajá-lo.

As pressões para aprofundar a ofensiva militar e forçar uma mudança de regime na Venezuela — o que representaria uma vitória política muito importante para o trumpismo — são poderosas. Ainda mais depois de se terem visto obrigados a reconhecer a sua derrota na Ucrânia, mas conseguirem impor a ocupação colonial e o genocídio contra o povo palestiniano com a farsa do plano de paz, e de a China e a Rússia o terem aceite com a sua abstenção na votação do Conselho de Segurança da ONU.

A actuação de Xi Jinping e Vladimir Putin é um factor-chave na equação. Até agora, fizeram declarações rejeitando as ameaças de Trump, e Putin ratificou o acordo de associação militar estratégica com Caracas. Mas não deixaram claro em que se concretizaria esse apoio nem até onde chegaria.

A possibilidade de aceitarem um recuo temporário na Venezuela, como fizeram com a queda de Bashar al-Assad na Síria, para se concentrarem em consolidar a sua vitória na Ucrânia e as suas posições na Ásia e em África, também não é de excluir. Tanto mais que mantêm posições económicas importantes noutros países latino-americanos. Embora seja óbvio que isso seria um golpe no seu prestígio e reforçaria Trump, para Xi e Putin não se trata de uma questão de princípios, mas sim do que consideram mais oportuno e rentável, em cada momento, para os seus interesses imperialistas. Demonstraram-no com a sua passividade perante o holocausto palestiniano.

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O povo venezuelano não pode confiar nos imperialistas chineses ou russos nem no regime burocrático e capitalista de Maduro, mas sim na mobilização massiva internacionalista contra o imperialismo, o trumpismo e os seus aliados da extrema-direita global.

Derrotar a agressão imperialista contra a Venezuela

Esta agressão dos Estados Unidos contra a Venezuela foi muito mais longe do que as anteriores. Todas as opções permanecem em cima da mesa, incluindo a de um ataque militar sangrento. O trumpismo e o imperialismo estado-unidense demonstraram ser capazes dos crimes mais horrendos e das maiores violações dos direitos humanos e da soberania dos povos.

Ao mesmo tempo, a aposta na guerra também comporta riscos importantes. A rejeição às políticas capitalistas de Nicolás Maduro e à sua repressão contra o sindicalismo combativo e a esquerda crítica fazem com que, até ao momento, não se tenham produzido, nem dentro nem fora da Venezuela, mobilizações multitudinárias contra o imperialismo estado-unidense como as que se viam na época de Hugo Chávez. Mas isto mudaria radicalmente com imagens de bombas ou drones a atacar território venezuelano, ou mais ainda um ataque directo com tropas, algo que os Estados Unidos não se atrevem a fazer desde a sua derrota no Afeganistão.

O povo venezuelano não pode confiar nos imperialistas chineses ou russos, nem no regime burocrático e capitalista de Maduro, mas sim na mobilização massiva internacionalista contra o imperialismo, o trumpismo e os seus aliados da ultradireita global.

O levantamento internacional contra o genocídio sionista foi também contra o trumpismo, a extrema-direita e a hipocrisia das instituições capitalistas. Um ataque militar à Venezuela provocaria uma reacção massiva. Neste momento, 70% da população estado-unidense rejeita, segundo uma sondagem recente da CBS, as ameaças de Donald Trump e a possibilidade de uma intervenção militar.

A esperança para o povo venezuelano não reside em confiar nos imperialistas chineses ou russos, nem nas políticas do regime burocrático e capitalista de Maduro, mas na mobilização massiva nas ruas contra o imperialismo, o militarismo e a ameaça mortal que representam o trumpismo e os seus aliados da ultradireita global. Esta mobilização de massas, incluindo a defesa militar da soberania venezuelana contra a agressão ianque, deve estar ligada à construção de uma esquerda revolucionária e a uma perspectiva internacionalista clara: a luta pela revolução socialista na Venezuela e na América Latina.

Fora da Venezuela as mãos criminosas de Trump e do imperialismo estado-unidense!

Por um movimento internacional de massas para os derrotar!

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