Basta de repressão, burocracia e ataques à classe trabalhadora. A direita e o imperialismo podem ser combatidos com verdadeiras políticas socialistas!

Artigo originalmente publicado a 09 de abril de 2024 pela secção venezuelana da Esquerda Revolucionária Internacional.

A 25 de março o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou os candidatos que poderão concorrer às eleições presidenciais venezuelanas de 28 de julho.

Por um lado, o imperialismo estado-unidense e os meios de comunicação social capitalistas têm feito barulho com o afastamento da sua marioneta, a ultra-reacionária María Corina Machado, ameaçando intensificar as sanções criminosas que têm vindo a manter há anos e que atingem duramente o povo venezuelano.

Que cinismo mais desprezível! Os mesmos que apoiam o massacre do povo palestiniano às mãos do governo sionista de Netanyahu, os responsáveis directos por guerras atrozes, golpes de Estado e ditaduras que custaram milhões de vidas em todo o mundo, querem-nos fazer acreditar que vêm agora defender o que entendem por "democracia".

Mas a nossa firme rejeição do imperialismo e dos seus agentes não pode esconder as ações anti-trabalhadores e cada vez mais repressivas do governo de Nicolás Maduro. Nestas eleições, a esquerda crítica das suas políticas, da sua estratégia de desmantelamento dos avanços conquistados pela classe trabalhadora durante os governos de Hugo Chávez e dos cortes brutais nos direitos sociais e pactos com a burguesia, também foi excluída.

A CNE invalidou as candidaturas do Encuentro Popular Alternativo (EPA), uma coligação do Partido Comunista da Venezuela (PCV) com outros partidos de esquerda (PPT-APR, Marea Socialista, PSL e MPA) e do dirigente chavista crítico Andrés Giuseppe. Outros sectores do chavismo críticos de Maduro também denunciaram a coação e as ameaças para impedir a sua candidatura.

Por outro lado, entre os candidatos autorizados encontram-se golpistas, corruptos e assassinos reconhecidos. Os exemplos são abundantes: o governador do Estado de Zulia, Manuel Rosales, os candidatos de partidos responsáveis pela corrupção e repressão durante os 40 anos da Quarta República (AD e Copei), líderes da investida fascista (guarimba1) de 2019, que matou vários trabalhadores e militantes chavistas, como José Brito; o empresário ultrareacionário Luis Ratti ou o próprio candidato "escondido" procurado à última da hora por Machado, Edmundo González.

Estes critérios duplos tornam ainda mais escandalosa a posição de dirigentes da esquerda governamental latino-americana como Boric, Lula e Petro, que não perderam um minuto em juntar-se ao coro que exige que Machado (ou a primeira substituta que procurou: a também ultra-reacionária Corina Yoris) seja autorizado a concorrer à presidência. No entanto, há anos que não se pronunciam perante as políticas repressivas do governo de Maduro contra a esquerda crítica e o sindicalismo combativo.

Nós temos uma análise clara. Maria Corina Machado é a Milei venezuelana. Ela e o resto da direita e extrema-direita, financiada por Washington, procuram recuperar o terreno perdido após a ofensiva golpista falhada de 2018-2019.

Neste momento, vestem a pele de cordeiro e criticam os baixos salários, a degradação dos serviços sociais, o aumento da pobreza, a insegurança, etc., para tentar tirar partido da enorme desilusão e raiva das massas. Se chegassem ao poder, os seus ataques aos trabalhadores seriam iguais ou piores do que aqueles que já sofremos. Submissão total às multinacionais estado-unidenses, despedimentos em massa, encerramento de empresas, repressão selvagem contra as lutas laborais e populares, .... como vemos na Argentina, no Peru ou no Equador.

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Maria Corina Machado é a Milei venezuelana. Ela e o resto da direita e extrema-direita, financiada por Washington, procuram recuperar o terreno perdido após a ofensiva golpista falhada de 2018-2019.

Um governo cada vez mais autoritário e comprometido com os capitalistas

Por outro lado, o carácter do regime político na Venezuela de hoje rompeu completamente com o legado revolucionário de Chávez, e está cada vez mais ligado à burguesia e a uma burocracia privilegiada. Os seus laços com o objetivo socialista da revolução bolivariana desapareceram.

Com os seus principais apoiantes, os imperialistas chineses e russos, a burocracia madurista está a desenvolver um regime de capitalismo de Estado e um governo de tipo Bonapartista burguês, no qual os militares desempenham um papel cada vez mais decisivo.

Maduro estabeleceu acordos vantajosos com a oligarquia e a burguesia de sempre, favoreceu o renascimento da pequena-burguesia, com a qual se funde a burocracia média e alta do Estado e do exército, e virou as costas a qualquer medida socialista e igualitária em defesa da classe trabalhadora e dos pobres.

Enquanto os ricos voltam a fazer bons negócios, acumulando capital nos bancos norte-americanos e europeus, Maduro concede migalhas sob a forma de bónus e bolsas de alimentos que não resolvem o empobrecimento nem compensam os retrocessos sociais. De facto, a degradação das condições de vida do povo agrava-se com os cortes nos preços subsidiados da eletricidade, da água, do telefone ou da habitação e com o agravamento do estado de todos estes serviços. E quando os trabalhadores respondem com a luta, o governo ativa a repressão, os despedimentos, os julgamentos farsa e as penas de prisão.

Este é o risco quotidiano que sofrem milhares de lutadores consequentes sob um governo que tem o descaramento de usar Chávez e palavras como "revolução" e "socialismo" na sua propaganda.

O autoritarismo, a violência e o terror contra os trabalhadores e as suas organizações de luta não têm nada a ver com o socialismo. Utilizar sistematicamente o aparelho judicial e policial para ameaçar, despedir e até prender ativistas sindicais por organizarem greves ou sindicatos independentes, ou procurar ilegalizar partidos como o PCV, não é socialismo. É a sua negação burocrática para benefício exclusivo da burguesia e da nova elite capitalista que está a ser formada a partir do poder do Estado.

Receoso do crescente descontentamento popular, que faz com que milhões de pessoas que apoiaram Chávez rejeitem Maduro, com níveis recorde de abstenção nas últimas eleições e um aumento espetacular da intenção de votar em candidatos da oposição, o governo está a manobrar para evitar a derrota. E está a fazê-lo de duas formas: impedindo qualquer candidatura que possa expressar este enorme descontentamento à esquerda, e travando o candidato de Washington, que poderia ganhar um apoio considerável aproveitando o crescente descontentamento com o regime.

Um regime que se esforça por apresentar a candidatura de Maduro como a única opção para evitar a chegada de um fantoche dos EUA a Miraflores. Mas o seu descrédito é tal que lhes é difícil mobilizar até mesmo as bases do PSUV.

Embora afirmem que a candidatura de Maduro foi apoiada por milhões de assinaturas recolhidas em supostas assembleias populares, militantes do PSUV e dirigentes populares denunciaram que estas assembleias ou nunca se realizaram ou foram realizadas sob o controlo férreo da burocracia, falsificando actas e ameaçando as comunidades com a perda de bónus e bolsas de alimentos emitidos pelo governo se não assinassem.

A rejeição do governo pode vir a expressar-se no apoio a um dos candidatos de direita autorizados a participar, como um voto de castigo e uma tentativa de sair da situação atual, ou numa abstenção muito elevada, como forma de protesto silencioso.

O que parece claro é que a burocracia estatal, incluindo a cúpula militar, recorrerá a todos os meios para garantir a reeleição de Maduro. Não abrirão as portas de Miraflores à oposição de direita financiada pelo imperialismo estado-unidense, precisamente quando este tem menos margem de manobra para novas ofensivas golpistas e, na cena internacional, mostra cada vez mais a sua decadência perante a China e a Rússia.

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A burocracia madurista está a desenvolver um regime de capitalismo de Estado e um governo de tipo Bonapartista burguês, no qual os militares desempenham um papel cada vez mais decisivo.

Reconstruir o movimento dos trabalhadores e popular com um programa comunista

Para a esquerda militante e combativa o desafio é claro: temos de lutar contra o imperialismo e a direita e contra esta contrarrevolução capitalista liderada pela burocracia. E isso significa reconstruir o movimento dos trabalhadores e popular com trabalho paciente, um programa de classe que reúna e unifique todas as necessidades e reivindicações dos trabalhadores e populares e rejeitar qualquer concessão, confiança ou compromisso tanto com os sectores burocráticos que tentam travar as lutas e a organização da classe trabalhadora como com os sectores da direita que tentam manipular o descontentamento com discursos demagógicos.

É por isso que nós rejeitamos totalmente as declarações do candidato apoiado pelo Encuentro Popular Alternativo, o jornalista Manuel Isidro Molina, ligando a anulação da sua candidatura à de María Corina Machado e saudando esta inimiga da esquerda, agente do imperialismo, como "honesta e lutadora".

Esta posição reacionária é inaceitável. Só ajuda a lavar a cara da extrema-direita e facilita à burocracia e ao seu aparelho de Estado o ataque à esquerda crítica e a tentativa de a separar dos sectores de massas que ainda olham para o PSUV porque é o partido que Chávez criou e não vêem uma alternativa suficientemente forte à sua esquerda.

Os dirigentes do PCV e das outras organizações do EPA devem dissociar-se destas declarações e romper com estes sectores da pequena-burguesia que se movem entre a esquerda e a direita em proveito dos seus próprios interesses.

As massas trabalhadoras precisam de uma alternativa real, com consciência de classe e revolucionária. A tarefa do momento é reconstruir o movimento sindical e as organizações operárias e populares com uma política de independência de classe e uma frente unida de todas as organizações de esquerda anti-capitalistas e anti-burocráticas.

Não há atalhos. Temos de trabalhar pacientemente com as pessoas, nos bairros, nos locais de trabalho, nas escolas secundárias e nas universidades, nos movimentos sindicais, feministas e LGTBI.

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Os dirigentes do PCV e das outras organizações do EPA têm de romper com os sectores da pequena-burguesia que se movem entre a esquerda e a direita em proveito dos seus próprios interesses.

Há que promover comités de ação independentes capazes de organizar a luta contra as políticas capitalistas do governo, a corrupção e a direita, com um programa e um plano de ação debatidos em assembleias democráticas.

Precisamos de erguer uma verdadeira direção nascida da coragem dos trabalhadores e popular e enfrentar este Estado podre de burocratas e capitalistas, confiscando as indústrias-chave, os latifúndios e os bancos e colocando-os sob a administração direta e democrática de representantes que possam ser revogados e eleitos pelos próprios trabalhadores e que respondam às necessidades do povo trabalhador.

Nada de desânimo! É preciso clareza e determinação! Junte-se aos comunistas da Esquerda Revolucionária para continuar a batalha!


Notas

1. NdT: Apesar do termo guarimba ter surgido na resistência ao regime militar de Marcos Pérez Jiménez (1953), no contexto atual refere-se à violência de direita contra o regime bolivariano.

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