Encontrar uma habitação digna em Portugal tornou-se praticamente impossível, com o número de pessoas forçadas a viver na rua a crescer a cada semana, com habitações clandestinas, sobrelotadas e sem condições. As respostas do Estado, como os apoios à habitação social, têm sido insuficientes, limitadas pelos interesses da burguesia financeira e do turismo, que lucram com a especulação imobiliária. Os incêndios têm mostrado como a exploração capitalista da floresta põe em risco a vida e a habitação de muitas pessoas. E caso haja mais desastres? O sismo que se sentiu em Portugal no final do mês de Agosto pode ser um sinal do que virá.

A falta de preparação sísmicas nas habitações e nas infraestruturas

Portugal está localizado numa zona de atividade sísmica significativa e com alto risco, com grande vulnerabilidade das infraestruturas públicas e de habitação, a segunda pior da UE. Pode não ser tão frequente como noutros países, mas os sismos podem ser de grande magnitude (> 7 na escala de Richter) e com epicentro perto dos centros urbanos com um impacto que pode ter resultados catastróficos. O recente sismo no final do mês de Agosto sentido por todo o país — que foi relativamente superficial, de magnitude 5,3 e cujo epicentro estava a cerca de 60 km a oeste de Sines — veio a lembrar o possível barril de pólvora que pode qualquer dia vir a explodir. Ficou o alerta para os danos significativos no caso do epicentro ser mais perto de terra ou do evento ser mais forte, como por exemplo, aconteceu no terramoto de 1755 ou no de 1969, com magnitudes superiores a 7,5 na escala de Richter. Não só é cada vez mais difícil encontrar habitação acessível, como muitas dessas casas não têm condições e são vulneráveis a este tipo de desastres. 

Segundo estudos feitos em 2023, estima-se que metade dos edifícios de habitação da capital não resistiriam a um sismo dito forte, e algumas simulações mostram ainda resultados mais desastrosos. Cerca de 60% dos edifícios em Lisboa foram construídos antes da década de 60, antes da implementação de regulamentação sísmica, que na prática até hoje não é fiscalizada consequentemente. Mas a falta fiscalização não é o problema de fundo, mas sim a busca do lucro a curto prazo que faz com que a segurança a longo prazo não seja uma prioridade.  Estima-se que o custo adicional na construção de novos edifícios para cumprir as normas sísmicas seja apenas 2 a 3% do custo total de construção (a adaptação de edifícios já existentes seria mais). Mas este custo adicional é visto pelos investidores só como uma perda de lucro — a habitação é primeiramente uma mercadoria para especulação.

Nos bairros mais pobres, onde cada vez mais há mais barracas e habitações improvisadas, a situação é ainda mais grave e precária. Em alguns casos, só é possível viver em Lisboa partilhando casa com mais 15 ou 20 pessoas, dormindo em beliches, como é o caso de muitos imigrantes, vivendo em condições de extrema precariedade. Num cenário de catástrofe natural, como um sismo de grande magnitude é a classe trabalhadora mais vulnerável e precária que sofrerá grande parte das consequências.

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Num cenário de catástrofe natural, como um sismo de grande magnitude é a classe trabalhadora mais vulnerável e precária que sofrerá grande parte das consequências.

A fragilidade não se limita às casas, pelo contrário. Hospitais, escolas, redes de gás, pontes, estradas e outros edifícios públicos também estão em risco. Por exemplo, o Hospital de Santa Maria, um dos maiores hospitais do país, foi construído na década de 1950, ou seja, não foi projetado para resistir a sismos. A maioria dos edifícios públicos construídos antes da década de 80 são os mais suscetíveis a danos severos ou mesmo colapso total. Com exceção do Hospital da Luz, privado, “que está preparado para o sismo com a melhor tecnologia que existe” — a prioridade aqui é proteger o lucro e o capital investido a longo prazo — muitos dos principais hospitais de Lisboa, como o Hospital de São José e o Hospital Curry Cabral, estão em risco de colapso. Até o futuro Hospital de Lisboa Oriental, apesar de todas as recomendações, não irá contemplar um sistema de proteção sísmica adicional. A segurança a longo prazo da população e da classe trabalhadora que mais usa os serviços públicos não é uma prioridade para a burguesia e o Estado.

Para além dos hospitais, uma boa parte das escolas públicas em Portugal tem condições miseráveis, com telhados de amianto e infiltrações nas salas de aulas e muito menos estão equipadas com proteção sísmica adequada, apesar de ser uma infraestrutura por onde passam milhares de crianças diariamente, muitas destas escolas localizadas em zonas urbanas. Outras infraestruturas críticas, como pontes, estradas e redes de distribuição de gás e eletricidade, também são vulneráveis. A central elétrica do Carregado é um dos exemplos mais críticos, pois providencia grande parte da eletricidade à cidade de Lisboa, e está localizada por cima de múltiplas falhas sísmicas. Um sismo de magnitude elevada poderia cortar o fornecimento de energia à capital, agravando ainda mais um potencial desastre. Estão também em risco todos os edifícios da frente ribeirinha, com a possível elevação do rio.

Esta estratégia de falta de investimento público tem um objectivo, que é debilitar os serviços públicos a favor dos privados. A falta de investimento no SNS alimenta o crescimento dos hospitais privados. O mesmo se pode dizer para as escolas, ou até para as creches ou outros serviços públicos. O problema de fundo é político: a gestão da infraestrutura pública e das casas não pode ser feita a favor da burguesia e em detrimento dos trabalhadores, especialmente os mais pobres, que deixam de ter acesso aos serviços e carregam todo o risco. A gestão tem de ser feita pela classe trabalhadora.

A habitação não pode estar subordinada a uma lógica de mercado!

Temos de gerir a habitação e estas infraestruturas pelas nossas mãos, enfrentando a lógica de lucro capitalista. É preciso haver uma planificação democrática da habitação, que só é possível se se colocar em causa o direito à propriedade privada da terra e o lucro capitalista, ou seja, exigindo uma mudança de sistema, lutando pelo socialismo.

É necessário haver uma expropriação sob controlo democrático dos trabalhadores dos grandes fundos imobiliários, da banca e dos setores da construção. Só assim podemos garantir o plano e investimento necessário para garantir a segurança onde habitamos e a manutenção necessária para as infraestruturas públicas. E só é possível fazer esse confronto e vencê-lo pela via da luta revolucionária e da ação de massas. Tem de haver um plano que garanta o direito à habitação –- plano tal que só é possível acabando com o mercado de especulação financeira e todos os mecanismos dos capitalistas para gerar lucro às nossas custas. Está na altura de sermos nós, os trabalhadores, a gerir as condições e como e onde vivemos.

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