O vídeo de agressões no Bairro da Jamaica mostra algo comum: violência racista de Estado. Mas aqueles polícias não imaginavam a consequência de mais uma agressão. O resultado ultrapassou o circo na comunicação social e o aproveitamento que alguns políticos burgueses fazem da miséria alheia. O episódio marca uma transformação qualitativa: a entrada de uma camada jovem de trabalhadores negros na política.

A partir dos bairros, espontaneamente, foi chamada uma manifestação para o dia seguinte. Duas centenas de jovens — negros e proletários — subiram a Avenida da Liberdade gritando palavras de ordem contra o racismo às portas da Versace, da Prada, da Gucci! Para o capital, isto é inadmissível. O direito do trabalhador pobre à cidade é o direito a limpar o chão e a servir a mesa de turistas. A polícia fez chover balas de borracha. A mensagem: “voltem para o vosso lugar!”

Mas a nova geração das camadas mais oprimidas e exploradas do proletariado não aceita o lugar que lhe dá o capitalismo. O seu lugar é na luta contra a violência racista do Estado! E o lugar de toda a esquerda e das organizações de trabalhadores é com estes jovens!

Os obstáculos à unidade da classe

A consciência de classe desponta muitas vezes com a raiva, e nos bairros lê-se a raiva nas paredes: fuck the police.

Esta é a raiva que sentiram os estivadores quando o seu piquete de greve foi rompido pela polícia, que sentiram os enfermeiros quando a sua greve foi alvo de uma requisição civil, que sentem as vítimas de violência machista quando as suas queixas são ignoradas na esquadra: raiva contra o Estado burguês.

Mas para vencer não basta raiva. É preciso raiva unificada, organizada, apontada aos órgãos vitais do inimigo. A fraqueza da classe trabalhadora está precisamente na sua actual desorganização e na ausência de uma direcção revolucionária que transforme a raiva em programa político.

A maioria dos trabalhadores está isolada na luta individual ou familiar para chegar ao fim do mês. A minoria organizada é dirigida por reformistas que pedincham migalhas ao “Estado de Direito”. Assim, as mais vastas camadas da classe não enfrentam colectivamente a polícia ou qualquer órgão do Estado burguês. Pior ainda, quando há enfrentamentos, os reformistas defendem a ordem burguesa. É assim com as greves dos estivadores e enfermeiros ou com a luta dos jovens negros contra a violência racista.

O comunicado da direcção do PCP defendeu a PSP para não “animar um ambiente de insegurança e intranquilidade.” Os burocratas perdem a tranquilidade com denúncias de violência racista, mas ficam tranquilos sabendo que há gente com salários de miséria, sem água nem luz, na companhia de ratazanas e sob bastonadas da PSP. O comunicado do PCP é uma nódoa na bandeira do comunismo!

A essa nódoa juntam-se as declarações da direcção do BE, que pela boca de Catarina Martins defendeu o bom nome da PSP e parabenizou-a pela abertura de uma investigação às agressões. Enquanto isto, Mamadou Ba, activista anti-racista e militante do BE, era ameaçado de morte por polícias e fascistas!

As burocracias atiram areia aos olhos dos trabalhadores. O que se exige é uma política socialista que utiliza as posições eleitorais — como o controlo da autarquia do Seixal — para dar força à luta dos trabalhadores, conquistar habitação digna e emprego, organizar a defesa contra racistas e fascistas.

Um programa socialista

Nós, marxistas, nunca escondemos a verdade. À burguesia, interessa manter bairros como o Jamaica para baixar salários e ter uma bolsa de força de trabalho barata. As leis da imigração servem o mesmo propósito: controlo da força de trabalho. Os polícias, por fim, são os capatazes dos escravos modernos, mantêm os trabalhadores “no seu lugar”. Assim se entende que fascistas estejam na PSP, à vista de todos, sem consequências.

A investigação aberta pela PSP é o absurdo. Criminosos a investigar o crime! É preciso colocar a polícia sob o controlo operário, tomar a nossa segurança nas nossas mãos. Isto, em primeiro lugar, significa organizar moradores dos bairros e exigir a abertura de uma investigação feita por organizações de trabalhadores e moradores para encontrar os fascistas na polícia, saneá-los e puni-los.
O mesmo exigimos com os tribunais. Juízes são polícias de toga. Por isso é que ilibam quem torturou jovens negros na esquadra de Alfragide. A justiça inteira tem de ser submetida ao controlo dos trabalhadores!

Mais ainda, foram as organizações de trabalhadores e moradores que, na Revolução Portuguesa, conquistaram a habitação digna. Hoje, o realojamento dos moradores de bairros como o da Jamaica tem de ser feito igualmente por organizações de trabalhadores e moradores. Se esperarmos pelo Estado burguês, não teremos realojamento, mas sim despejos como no 6 de Maio e no Santa Filomena.

Um Estado é o instrumento de dominação de uma classe sobre outra. A violência racista é uma das formas que assume o poder da burguesia. Contra ela, a única arma eficaz é o poder do proletariado, é o socialismo!

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