Levantar uma política revolucionária contra os imperialistas e os capitalistas mexicanos

Em menos de um mês do início da nova administração Trump, estamos perante uma ofensiva brutal do imperialismo norte-americano. Perante a maior situação de crise e decadência da sua história, Washington age como um animal raivoso. A perseguição selvagem e a deportação em massa de migrantes, como já explicámos noutros artigos, faz parte de uma ofensiva fascista contra o que o próprio Trump e Elon Musk chamam de "inimigo interno": a classe trabalhadora migrante e a própria classe trabalhadora dos EUA, o movimento feminista e LGTBI e a esquerda. A par disso, esta ofensiva procura também aumentar o domínio do imperialismo estado-unidense sobre os povos, recorrendo a medidas cada vez mais desesperadas, agressivas e violentas, atingindo mesmo países com os quais tem acordos comerciais. Um dos principais alvos desta ofensiva é o povo mexicano.

O imperialismo estado-unidense pretende exportar a sua crise para todo o mundo, mas o efeito pode ser especialmente devastador para uma economia como a do México, historicamente dependente dos EUA.

As medidas raivosas de Trump são uma declaração de guerra às trabalhadoras e aos trabalhadores mexicanos e latinos no país e no estrangeiro. As ameaças de Trump de impor tarifas de 25% aos produtos mexicanos, as suas tarifas sobre o aço e o alumínio, a sua repressão contra os imigrantes, a sua pressão sobre o governo mexicano para reduzir as importações e os seus laços comerciais com a China podem levar à asfixia económica do país.

Estas primeiras semanas foram suficientes para deixar claro que as ameaças xenófobas e supremacistas não são uma brincadeira, nem os delírios de um louco. Outra coisa é o facto de a interdependência entre as duas economias e a resistência interna do movimento nos EUA, até mesmo as próprias divisões na classe dominante, não permitirem que este pretenso ditador fascista implemente as suas políticas como pensa e deseja.

Supremacismo puro e duro

A suposta luta contra o fentanil e o crime organizado é uma farsa. Trump não se preocupa com a saúde pública da sua população, algo que é palpável com a sua privatização da saúde pública, a retirada do seu país da OMS e a eleição de um anti-vacinas para o departamento de saúde.

Como comprovam inúmeros estudos e denúncias de organizações e movimentos sociais, inclusive da própria presidente, Claudia Sheinbaum, a substância que tem causado esta epidemia de dependência é totalmente legal nos EUA e é comercializada por grandes empresas farmacêuticas, sem qualquer restrição.

A administração Trump continua a ceder aos negócios destas empresas farmacêuticas, que desempenharam um papel fundamental na dependência de milhões de jovens e trabalhadores estado-unidenses e que ficaram ricas com isso.

Além disso, tem uma política abertamente favorável à venda de armas, as mesmas armas com que os grupos criminosos se armam.

Também não propôs quaisquer medidas contra o branqueamento de capitais nas mãos dos grandes bancos, empresas de turismo e de transportes dos EUA, sem os quais o grande negócio do tráfico internacional de droga seria impossível. Que tal oferecer alternativas decentes de emprego, educação, arte e cultura para que a população estado-unidense tenha alternativas saudáveis de lazer, certeza e motivação para uma vida livre de drogas?

Para o México, a ofensiva anti-imigração terá efeitos muito duros a curto e médio prazo. Em primeiro lugar, todo o sofrimento que está a causar a milhares de famílias migrantes ou mistas que vivem no terror de serem separadas e deportadas sem nada do que construíram durante anos em solo estado-unidense.

Além disso, reflectindo também o carácter reacionário e parasitário da burguesia nacional, a dependência do capitalismo mexicano das remessas só tem aumentado. As remessas têm crescido de forma constante nos últimos cinco anos e, embora o terror trumpista as tenha aumentado no imediato — em 2024 aumentaram 2,3% e só em novembro de 2024 aumentaram 10% —, a longo prazo, será inevitável uma queda com a redução do número de migrantes que enviam remessas. As remessas equivalem a cerca de 5% do PIB do México e delas dependem zonas inteiras do país.

Mas, como já foi dito, a última palavra ainda não foi pronunciada. A ofensiva anti-imigração pode tornar-se um boomerang para os sectores que dependem desta mão-de-obra extremamente precária, como a agricultura, a pecuária e os serviços de assistência. A mão-de-obra migrante representa quase 20% do total da força de trabalho nos EUA e os sectores acima referidos dependem dela até 80%, bem como uma boa parte do mercado e das receitas fiscais.

A realidade é que os migrantes são um bode expiatório para desviar a responsabilidade da classe dominante dos EUA pela atual crise. É uma política muito perigosa que ilustra as tendências fascistas do trumpismo. Além disso, é acompanhada pelo supremacismo inerente aos xenófobos de tipo hitleriano. Este supremacismo é também evidente nas suas intenções anexionistas sobre a Gronelândia, o Canal do Panamá ou a mudança de nome do Golfo do México (agora chamado Golfo da América no Google).

Estas afirmações não são aleatórias, fazem parte de uma estratégia cada vez mais agressiva e desesperada para tentar travar a ascensão da China, que nos últimos anos destronou os EUA nos países da América do Sul como principal parceiro comercial e já está a competir com os Estados Unidos noutras áreas que considera "suas", como a América Central e o México. Na medida em que não consegue lutar no domínio da competitividade industrial ou tecnológica, como demonstraram recentemente os saltos da China no domínio da Inteligência Artificial, não lhe resta outra alternativa senão impor-se pela força, de forma selvagem.

Guerras de  tarifas e intervencionismo

A insistência de Trump em impor tarifas sobre os produtos mexicanos tem como objetivo fundamental fechar a passagem de componentes e mercadorias chinesas pelo território mexicano, ao mesmo tempo que tenta reduzir o seu défice. Embora o México não seja o país com o qual tem o maior défice, a fraqueza e a falta de produtividade do imperialismo norte-americano leva-o a atacar em todas as direcções.

Mas há uma lacuna na sua estratégia, pois todas as tarifas do mundo serão insuficientes se os Estados Unidos não inverterem o seu processo de desindustrialização. E não parecem estar a ir por esse caminho, bem pelo contrário. As suas fichas estão no capital financeiro e em mais especulação. Assim, o efeito inflacionista pode gerar uma crise muito forte nos EUA.

Trump poderia reforçar a via bélica de forma ainda mais agressiva, como explica Lenine em Imperialismo, a Fase Superior do Capitalismo: "Os capitalistas não dividem o mundo movidos por uma perversidade particular, mas porque o grau de concentração atingido os obriga a seguir essa via para obter lucros; e dividem-no "segundo o capital", "segundo a força": outra forma de repartição é impossível no sistema de produção mercantil e no capitalismo".

De facto, há anos que os EUA têm vindo a aumentar o seu intervencionismo. Primeiro, colocando "falcões" em todos os aspectos estratégicos da política para a América Latina, como Terry Cole, diretor da DEA [Drug Enforcement Administration], uma agência tradicionalmente intervencionista e corrupta, ligada a grupos criminosos e que, recentemente, realizou mais de 18 incursões aéreas ilegais em território mexicano nos primeiros dias de fevereiro deste ano. Ou agora com Trump nomeando Marco Rubio, um inimigo declarado da esquerda latino-americana, como Secretário de Estado.

Entre 2014 e 2022, os EUA aumentaram a sua quota de vendas de armas na região em 17%. Entre 2007 e 2014, as forças especiais estado-unidenses triplicaram as suas missões de treino na América Latina.

Nos últimos quatro anos, o intervencionismo dos EUA intensificou-se com a chamada "dissuasão integrada", que nada mais é do que a Doutrina Monroe 2.0. Sob o pretexto de manter a "paz e a estabilidade", os EUA justificam a sua participação no golpe de Estado contra Castillo no Peru, o assassinato em 2021 do presidente haitiano Jovenel Moise, o seu intervencionismo no processo eleitoral equatoriano e argentino, etc.

Os EUA continuam a ser o principal fornecedor de armas do país, com 90.7%. Em 2018, o México adquiriu armas no valor de 1.339 milhões de dólares e até abril de 2024 havia cinco pedidos do executivo aprovados pelo Senado para permitir a entrada de tropas militares em território nacional sob o pretexto de participarem na atividade de formação “Melhorar a Capacidade contra Armas de Destruição Maciça”, uma das quais permitia a entrada de 436 militares estado-unidenses em diferentes tropas nos Estados do México, Chiapas e Chihuahua entre os meses de maio e agosto de 2024.

Mesmo assim, é preciso dizer que os EUA têm a menor presença militar da sua história em solo latino-americano, daí a pressa em recuperar o tempo perdido.

A oligarquia mexicana parasita é aliada do imperialismo, não do povo trabalhador.

Perante a atitude assediadora, agressiva e ameaçadora do trumpismo, o governo de Sheinbaum fez declarações denunciando essa atitude, mas foi submisso nos actos. O México respondeu favoravelmente a todos os pedidos de Trump. Enviou 10.000 agentes da guarda nacional para a fronteira norte. Está a limitar o comércio com a China. No ano passado, o Ministério da Economia emitiu uma lista de tarifas acrescidas sobre 544 produtos chineses, na sequência da pressão de Washington, para travar a triangulação de alumínio e aço chineses que entram nos EUA através do país.

Em troca, o programa "O México abraça-te" para acolher os migrantes, longe de abordar a situação dramática em que vivem, deixa os deportados entregues à sua sorte.

O problema subjacente é o caráter parasitário e reacionário da burguesia e do capitalismo mexicanos, que se expressa em décadas de dependência do imperialismo estado-unidense. Mesmo durante o governo de AMLO, a rota da dependência continuou. De 2018 a 2024, as exportações para os EUA cresceram de 79,5% para 83%, e o México tornou-se o principal parceiro comercial dos EUA.

Uma luta consequente contra a dependência e a subjugação ao imperialismo norte-americano só pode ser acompanhada de políticas que ponham fim ao domínio da economia mexicana pelos capitalistas. Muitos na esquerda reformista e possibilista argumentam que isso não é possível.

Mas o imperialismo norte-americano não está já a ter uma atitude intervencionista? Não está já a lançar as sementes para um golpe de Estado, sufocando a economia mexicana e isolando-a? Não está já a armar o crime organizado? Não está já a financiar a direita e a extrema-direita mexicanas? Mas toda a história da América Latina e do mundo mostra que a única maneira de derrotar o imperialismo é mobilizar e entusiasmar as massas com políticas revolucionárias que expropriem a oligarquia e mobilizem todos os recursos para a resolução dos problemas sociais.

Limitar-se a responder aos ataques do imperialismo e da oligarquia com declarações diplomáticas ou, pior ainda, apelando a pactos com setores supostamente democráticos da burguesia (que nunca ninguém viu) só pode facilitar os planos do imperialismo e da oligarquia.

O reforço do poder das empresas mexicanas, sugerido por Sheinbaum e pelo Conselho de Coordenação Empresarial, só pode significar mais insegurança no emprego, salários baixos e horários de trabalho mais longos para a classe trabalhadora. Eles próprios o dizem quando falam em "olhar para os tempos" e "custos" para desenvolver uma indústria nacional em resposta ao apelo da presidente através do Plano Nacional.

Claudia Sheinbaum gaba-se dos acordos com os empresários, agradecendo-lhes o seu apoio e convidando-os a cerrar fileiras, ignorando a experiência latino-americana, que é esmagadora. Os nossos aliados não podem ser aqueles que desempenharam o papel de capangas do imperialismo, como os empresários que estão por detrás do boicote económico à Venezuela, que estiveram por detrás do golpe de Estado no Chile ou na Argentina, aqueles que hoje estão no Equador a governar lado a lado com Noboa, no Panamá com José R. Mulino, na Argentina com Milei ou em El Salvador com Bukele.

Por uma frente única contra o trumpismo e os seus agentes

O único caminho é exatamente o oposto, lutar e expropriar tanto os capitalistas mexicanos como as transnacionais dos EUA e de outras potências imperialistas sob a gestão democrática dos trabalhadores para os pôr a trabalhar para as necessidades do povo e não para a dinâmica caótica do mercado capitalista e para os lucros de um punhado de capitalistas.

A frente única contra o imperialismo só é possível entre os diferentes sectores da classe trabalhadora que têm nas suas mãos o controlo da produção, a juventude sem correntes nem compromissos políticos, o campesinato que defende os seus territórios contra a pilhagem imperialista, as mulheres em luta pelos seus direitos contra os retrógrados reitores, a comunidade sexo-diversa com a sua luta feroz para ser o que é sem qualquer tipo de opressão, etc.

A unidade só pode ser alcançada sob o mesmo programa de luta destes sectores no México e com uma luta internacionalista com a classe trabalhadora norte-americana e sul-americana contra os nossos inimigos de classe comuns: os capitalistas mexicanos e as transnacionais imperialistas.

Temos de seguir o exemplo e alargar a luta dos migrantes latinos e da população norte-americana nos EUA, derrubar os governos de direita no continente, fechar a porta a estas tendências e apoiar a luta interna nos EUA contra o Trumpismo.

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