O dia 21 de fevereiro de 2017 marca o 52º aniversário do assassinato de Malik el-Shabazz, mais conhecido por Malcolm X, dirigente revolucionário afro-americano que expôs o racismo, a supremacia branca e a opressão a que estava e está sujeita a população negra, não só nos EUA como em todo o mundo.

Malcolm tem um primeiro e brutal contacto com o racismo aos 6 anos, quando sofre com a morte do seu pai, Earl Little, assassinado por membros do grupo KKK por estar envolvido no movimento de Marcus Garvey. Outro episódio marcante da sua infância foi a resposta de um professor, que após Malcolm revelar que queria ser advogado, este lhe diz que, face à sua condição de negro, carpinteiro era uma profissão mais realista.

O seu envolvimento organizado na luta política começou em 1952 enquanto membro da Nação do Islão (NOI), organização liderada por Elijah Muhammad. Esta, ao contrário do que o nome sugere, promovia um conjunto de ideias nacionalistas com linguagem religiosa e uma teologia que misturava cristianismo, islamismo e mitos completamente originais da organização. O mais importante, no entanto, era que a NOI condenava as condições horríveis enfrentadas pela população negra desde o período da escravatura que, como disse Malcolm X, continuou para lá de 1865. Malcolm tomou conhecimento da NOI em 1948, nos seus últimos anos de prisão, onde cumpria pena por crimes de assalto que cometeu na sua tempestiva juventude de pobreza e revolta.

Em 1950, numa carta ao presidente Truman, Malcolm expressa a sua oposição à Guerra da Coreia. Este foi também um dos primeiros registos em que assina como “Malcolm X”. Explica mais tarde que o “X” utilizado entre os membros da Nação do Islão representa o apelido africano que foi retirado aos seus antepassados pelos senhores de escravos.

Malcolm dedica os anos seguintes à NOI, onde revelou as suas qualidades de orador e organizador, o que lhe permitiu alcançar rapidamente o cargo de Ministro Assistente do Templo nº1 de Detroit e pouco depois o de Ministro do Templo nº7, no Harlem. Nos anos seguintes chegaria a representante nacional, tornando-se a mais influente e conhecida figura da NOI.

Nos seus discursos iniciais, Malcolm dava voz à raiva que era sentida pelos trabalhadores negros explorados e oprimidos pelo racismo. Era recorrente chamar os homens brancos de “demónio de olhos azuis”, e a solução que apresentava era a criação de uma nação negra nos EUA. Defendia que, como o Homem branco não era capaz de aceitar a realidade, acusava Elijah Muhammad de praticar um discurso de ódio. A sua resposta era clara:

“Quem vos ensinou a odiar a textura do vosso cabelo? Quem vos ensinou a odiar a cor da vossa pele de tal modo que a clareiam para ter a aparência dos brancos? Quem vos ensinou a odiar a forma do vosso nariz e a forma dos vossos lábios? Quem vos ensinou a odiar-vos a vós próprios da cabeça aos pés? Quem vos ensinou a odiar os vossos? Quem vos ensinou a odiar a raça a que pertencem, tanto que nem querem estar perto uns dos outros? Pois, antes de virem perguntar ao Sr. Muhammad se ele ensina o ódio, deviam perguntar quem vos ensinou a odiar o que Deus vos deu!»

Os seus discursos iam muito além da raiva. Expunham também a história — distorcida pelos media burgueses e pelo sistema de educação — do seu povo e enchiam os oprimidos de confiança. Combateu todas as ideias racistas que faziam os negros e negras sentir-se inferiores em força, inteligência e beleza.

Malcolm viveu num período de grande tensão política e social, a Guerra Fria, tendo assistido às revoluções de Cuba, China, Vietname e Argélia e ao assassinato do Primeiro Ministro do Congo, Patrice Lumumba. Estes eventos tiveram um efeito profundo no desenvolvimento da visão política de Malcolm.

Após a morte de John F. Kennedy, a 22 de novembro de 1963, Malcolm é questionado sobre este acontecimento, tendo respondido com o ditado: “The chickens come home to roost”, querendo assim dizer que os actos de violência que JFK não foi capaz de impedir — neste caso, os actos contra a população negra — se viraram contra ele de forma trágica. Esta afirmação resultou no seu “silenciamento”, foi proibido por Elijah Muhammad de falar publicamente durante 90 dias.

Esta imposição, juntamente com a descoberta de que o líder da NOI tinha filhos fruto de relacionamentos fora do casamento, resultam na saída definitiva de Malcolm da organização.

Após este afastamento, Malcolm viaja para Meca com o intuito de conhecer o Islão e converte-se. Nesta viagem, contacta pela primeira vez com muçulmanos de várias etnias e culturas, o que lhe permitiu mudar a sua visão sobre o Homem branco, passando a adoptar uma postura mais humanista, defendendo a unidade entre explorados e oprimidos, brancos e negros, mas sem aceitar o pacifismo de Martin Luther King.

Nos meses seguintes, funda a Organização para a Unidade Afro-Americana, uma organização inspirada na Organização da Unidade Africana e com uma política de internacionalismo. É nesta fase final da sua vida que se aproxima das ideias socialistas e participa com alguma frequência em eventos do Socialist Workers Party (Partido Socialista dos Trabalhadores).

Malcolm tinha a intenção de levar à ONU uma acusação contra os Estados Unidos da América, denunciando o seu imperialismo e a forma como tratava a comunidade afro-americana. Considerava uma hipocrisia por parte das outras Nações estarem ao lado de uma potência imperialista, denunciando apenas os crimes cometidos na África do Sul durante o regime do Apartheid e na guerra colonial em que Portugal estava envolvido.

As suas capacidades para organizar e inspirar as massas no combate internacional ao racismo e imperialismo trouxeram consequências fatais. A 21 de fevereiro de 1965, Malcolm é assassinado por 3 membros da Nação do Islão na sede da sua organização, onde se preparava para discursar. Este assassinato, como mais tarde se comprovou, foi levado a cabo com o apoio do departamento de polícia de Nova Iorque e do próprio FBI.

“Não é possível haver capitalismo sem racismo!”

Meio século passou e as mesmas condições que formaram Malcolm continuam presentes na sociedade actual: racismo, discriminação, desemprego, pobreza, repressão policial, todas fruto de um sistema capitalista doente, desenhado para explorar as minorias e enriquecer uma pequena elite burguesa.

No entanto, o legado de Malcolm está vivo. Assistimos ao aparecimento de novos revolucionários, como os activistas do movimento #BlackLivesMatter, que condenam os actos de violência policial sobre afro-americanos, que já resultou na morte de vários inocentes.

Em Portugal, assiste-se a um cenário semelhante, com casos como o de Elson Sanches, de 14 anos, negro e de classe trabalhadora, que em 2014 foi alvejado à queima-roupa por um polícia, estando desarmado. Muitos outros jovens negros têm sido assassinados pela polícia ao longo dos últimos anos. Temos ainda os despejos no Bairro 6 de Maio, na Amadora, onde famílias negras estão a ser retiradas de suas casas através da força policial.

Não podemos baixar os braços! Vivemos um período conturbado, tão conturbado como o de Malcolm X. A nossa época é marcada pela instabilidade política provocada pela crise económica e conflitos armados no Médio Oriente, que alimentam o ódio de muitos face às minorias e contribuem para o crescimento de forças de extrema-direita pelo mundo, como é o caso do actual Presidente dos Estados Unidos ou da candidata à presidência de França, Marine Le Pen.

Tal como o próprio Malcolm X declarou pouco antes do seu assassinato:

“A jovem geração de brancos, negros, castanhos e seja lá o que for está a viver numa era de extremismo, numa era de revolução, numa era em que tem de haver uma mudança. Aqueles que têm o poder abusaram dele, e agora tem de haver uma mudança e um mundo melhor tem de ser construído. E a única forma de o construir é com métodos extremos. Eu juntar-me-ei a qualquer um — não me interessa de que cor — desde que queira transformar esta condição miserável que existe hoje na Terra!”

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