Nos passados dias 13 e 14 de novembro, a Esquerda Revolucionária Internacional celebrou o seu segundo congresso. A discussão, que se prolongou durante um dia e meio, analisou em profundidade os grandes acontecimentos da luta de classes do último período: desde os levantamentos populares e insurreições que sacudiram dezenas de países em anos recentes, passando pela catástrofe social e económica precipitada pela irrupção da pandemia, a alteração na correlação de forças mundiais, assim como a ascenção da extrema-direita populista e o fracasso das novas formações da esquerda reformista.

A base para este debate foi o documento Perspectivas Mundiais que preparamos no início de setembro, e que foi discutido e alterado em todas as seções da Esquerda Revolucionária Internacional ao longo de dois meses. Publicamos o documento aprovado por unanimidade no congresso em duas partes. Segue-se a primeira.

Clica AQUI para leres a segunda parte.


A luta de classes na época da decadência capitalista

I. A crise do capitalismo global e a luta pela hegemonia

A humilhante derrota do imperialismo estado-unidense e dos seus aliados no Afeganistão, após vinte anos de ocupação e perto de 250.000 mortos, expôs perante a opinião pública mundial a decadência em que continua a principal potência do Ocidente. Wall Street e o complexo militar-industrial obtiveram lucros recorde com esta guerra, mas, quando considerado no seu conjunto, o saldo é devastador para os seus interesses. A estratégia externa da burguesia estado-unidense após a queda da URSS — atuar como um gendarme global com carta branca — colecionou fracasso após fracasso na última década.

O Afeganistão é o culminar de um processo mais amplo que ganhou velocidade após a Grande Recessão de 2008. A ascensão da China como superpotência e a extensão da sua influência política, diplomática e militar está a determinar transformações profundas e irreversíveis nas relações internacionais. Este fator soma-se ao que aconteceu no último ano e meio, quando a pandemia precipitou uma catástrofe sanitária, social e económica sem precedentes desde a Segunda Guerra Mundial. Os cinco milhões de mortos e 216 milhões de infetados demonstram a extrema degeneração da classe dominante e do seu sistema.

As forças produtivas colidem com o colete-de-forças que são a propriedade privada dos meios de produção e o Estado nacional. O crescimento exponencial da pobreza, do desemprego em massa, da precariedade e da superexploração, a desigualdade imparável e a catástrofe climática são o preço a pagar pelos lucros estratosféricos da plutocracia financeira global. Nunca na história o fosso entre ricos e pobres foi tão pronunciado.

A ditadura do capital financeiro tornou-se omnipresente a tal ponto, o equilíbrio do sistema desapareceu tão claramente, que as formas tradicionais de dominação foram severamente afetadas. A crise do parlamentarismo burguês e dos partidos tradicionais do sistema, a falência das novas organizações da esquerda reformista, a ascensão do populismo reacionário e da extrema-direita, os ataques generalizados aos direitos democráticos, tudo isto resulta do beco sem saída em que a sociedade como um todo se encontra, assim como resulta a cadeia de explosões sociais, insurreições e levantamentos populares que abalaram muitos países nos últimos dois anos.

A resposta da China ao desafio da covid

O desenvolvimento das forças produtivas na China durante as últimas três décadas, e o seu regime peculiar de capitalismo de Estado, deve ser estudado com grande atenção pelos marxistas. É um fenómeno que só pode ser comparado com a ascensão do imperialismo estado-unidense após a Primeira Guerra Mundial — e a substituição da Grã-Bretanha como potência dominante — ao mesmo tempo que tem peculiaridades específicas que tornam este acontecimento algo inédito e original. Adiante aprofundamos este aspecto.

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Se compararmos a forma como o regime de Pequim lidou com a pandemia e como a classe dominante ocidental lidou com ele, temos de reconhecer que a superioridade demonstrada pelo capitalismo de Estado chinês.

Se compararmos a forma como o regime de Pequim lidou com a pandemia e como a classe dominante ocidental lidou com ele, temos de reconhecer que a superioridade demonstrada pelo capitalismo de Estado chinês tem sido esmagadora. Uma análise dos números oficiais é suficiente para compreender a diferença: em termos do número de mortes por 100.000 habitantes, os EUA têm 400 vezes a taxa de mortalidade da China, enquanto a Alemanha tem 200 vezes.

DADOS COVID-19 ATÉ 26/08/2021

Mortos

Diagnosticados

Taxa Mortalidade 100.000 habitantes

População em milhões

Mundo

4.495.014

216.026.420

não disponivel

7.700

EUA

633.564

38.384.360

191,98

330

China

4.848

106.905

0,34

1.440

Alemanha

92.108

3.923.250

110,97

83

Grã-Bretanha

132.465

6.659.916

197,70

67

Estado Espanhol

83.861

4.822.320

176,92

47.4

As reservas acumuladas pelo capitalismo chinês permitiram que o regime Bonapartista de Xi Jinping mobilizasse uma enorme quantidade de recursos, controlasse e quase erradicasse a pandemia. Este importante acontecimento foi, evidentemente, censurado pelos meios de comunicação ocidentais.

Quando o vírus deu os primeiros sinais de alarme, o governo chinês confinou a cidade de Wuhan, com 11 milhões de habitantes, e pouco depois a província de Hubei, com 45 milhões. O economista marxista francês François Chesnais explica: "Cerca de 580.000 voluntários foram mobilizados do campo ou de outras cidades para ajudar os residentes a satisfazer as suas necessidades (...). Entre o final de janeiro e abril [2020], 35.000 médicos chegaram a Wuhan, o epicentro da epidemia (...) [e] 12.000 trabalhadores para construir dois hospitais de campanha especializados em infecções que trataram milhares de pessoas com covid-19. O exército chinês também enviou 340 equipas contabilizando um total de milhares de médicos militares (...). A necessidade diária de EPIs em Wuhan era de 60.000 fatos de proteção (...) [e] a China produz normalmente apenas 30.000". O governo mobilizou "empresas públicas de todo o país para acelerar a produção de EPIs existentes e construir novas linhas de produção (...) em meados de fevereiro, a escassez de EPI tinha sido ultrapassada. Todos os trabalhadores da saúde usavam fatos de proteção (...) uma empresa de genética e de diagnóstico chamada BGI construiu em Wuhan, em poucos dias, o laboratório Huo-Yan, um centro de diagnóstico covid-19 totalmente funcional capaz de testar dezenas de milhares de pessoas”1.

Enquanto nos EUA e na Europa as infecções e mortes por covid-19 se tornaram numa ocorrência diária, sem nunca erradicar completamente o vírus, a China derrubou os poucos ressurgimentos numa questão de semanas2. O último, no final de julho, da variante Delta, foi parado com encerramentos e confinamentos rigorosos, incluindo todos os transportes, e 100 milhões de testes numa questão de dias em cada uma das cidades afectadas. A tecnologia desempenhou um papel eficaz, sendo utilizados "dados de localização em tempo real de telemóveis" alimentando "servidores de inteligência artificial que calcularam a probabilidade de novos surtos de infecção"3.

A burguesia ocidental e os seus porta-vozes responderam a esta acção afirmando que existe uma ditadura na China. Mas a "democracia" ao estilo americano e europeu, que é suposto mostrar a sua justiça social, as suas conquistas civilizacionais, o seu espírito progressista, enriqueceu os grandes monopólios farmacêuticos enquanto milhões de pessoas foram abandonadas. Nestas democracias, os cuidados de saúde pública foram devastados. E se falarmos de países ex-coloniais sob influência ocidental, como a Índia, a "maior democracia do mundo", ou do Brasil de Bolsonaro, o resultado é aterrador4.

Não temos qualquer intenção de pintar um quadro idílico do regime liderado pelo PCC. Mesmo que se envolva numa faixa vermelha com o martelo e a foice, representa os interesses da burocracia estatal e da nova burguesia chinesa. Não é um Estado operário e nada tem a ver com socialismo, e o carácter capitalista e bonapartista da presidência de Xi Jinping é uma certeza. Mas fazer eco da propaganda ocidental é uma completa estupidez.

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O regime encabeçado pelo PCC representa os interesses da burocracia estatal e da nova burguesia chinesa. Mas fazer eco da propaganda ocidental é uma completa estupidez.

O que tornou possível esta diferença? A "eficácia" dos planos da China contra a pandemia é alimentada pelo seu gigantesco e vigoroso tecido produtivo e comercial, que são a expressão do avanço das forças produtivas nas últimas décadas. Mas há algo mais, e que algo mais é realmente importante. A nomenklatura que lidera o PCC e o aparelho do Estado não são uma casta de principiantes. Há décadas que estão habituados a controlar as alavancas do poder, e desenvolveram uma compreensão clara dos seus próprios interesses.

Os elementos de planeamento e centralização na economia chinesa — herdados do antigo Estado operário deformado — desempenham um papel importante no actual sistema de capitalismo de Estado, dando-lhe uma grande vantagem sobre os seus concorrentes. A burocracia pró-capitalista compreendeu, e fez os grandes empresários compreenderem, inclusive através da força e da coerção, duas coisas. Primeiro, que se a pandemia escapasse ao seu controlo, o problema não seria um ou dois trimestres negativos, mas um longo e agonizante retrocesso. Segundo, que não estava disposta a tolerar que nenhum plutocrata acumulasse tanto poder nas suas mãos que ameaçasse o poder da burocracia estatal.

Um crescimento espetacular

A China regista há mais de duas décadas um crescimento espectacular, enquanto a economia ocidental está em recessão e estagnação há treze anos. Se no ano 2000 a formação bruta de capital fixo da China foi estimada em 400.000 milhões de dólares, em 2018 atingiu 5,5 biliões de dólares, ultrapassando o recorde dos EUA. Não é uma coincidência que o ponto de viragem tenha ocorrido precisamente entre 2008 e 2010.

FORMAÇÃO BRUTA DE CAPITAL FIXO (BILIÕES DE DÓLARES)

Ano

China

EUA

Relação China/EUA [1]

2000

0.4

2.4

16.7

2010

2.9

2.8

103.6

2018

5.7

4.3

132.6

[1] Percentagem da China em relação ao total dos EUA (Fonte: Indexmundi) 

Graças a este investimento massivo de capital, a China tornou-se a fábrica do mundo e os seus produtos inundaram todos os continentes. Desde 2008, o valor total das suas exportações nunca desceu abaixo de 1,2 biliões de dólares, a partir de 2012 o limite inferior foi fixado em mais de 2,2 biliões de dólares, e em 2020, ano da pandemia, atingiu um recorde de 2,49 biliões de dólares, atingindo assim um excedente comercial recorde de 535.030 milhões de dólares, o mais elevado em cinco anos! Durante a presidência de Trump, o défice comercial dos EUA com a China, longe de diminuir, aumentou 13%, e aumentou mais 19,2% em 2021 até agora. Em 2020, a China foi responsável por 30% da produção industrial mundial, em comparação com 18% dos EUA.

Os EUA perderam a sua posição como banqueiros do mundo. A China é agora um credor de mais de cinco biliões de dólares, um valor equivalente a 6% do PIB mundial. A quota do gigante asiático relativa ao crédito total concedido pelos países do G20 a outras nações aumentou de 45% em 2013 para 63% no final de 2019. A China é o maior detentor da dívida dos EUA depois do Japão.

Em 2020, pela primeira vez, a China ultrapassou os EUA como o principal destino do Investimento Estrangeiro Direto (IED): enquanto o IED aumentou 4% na China, caiu 49% nos EUA. Entre 2015 e 2020, o IED caiu 71% nos EUA, e aumentou 20% na China. Estes dados tornam claro o fracasso da guerra comercial de Trump.

INVESTIMENTO ESTRANGEIRO DIRETO

Ano

China

EUA

2016

134.000

472.000

2019

140.000

250.000

2020

163.000

134.000

(Fonte: UNCTAD)

Mas as mudanças estendem-se a outras áreas não menos importantes. A China está a travar a guerra pela supremacia tecnológica de uma forma perseverante, como mostra o seguinte quadro:

INVESTIMENTO EM INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (% do PIB)

Ano

Mundo

EUA

China

Alemanha

1998

1.98

2.50

0.65

2.21

2000

2.06

2.63

0.89

2.4

2010

2.02

2.74

1.71

2.71

2018

2.27

2.84

2.19

3.09

(Fonte: Banco Mundial)

Embora a Alemanha tenha gasto em 2018 uma maior percentagem do PIB em investimento em investigação do que a China, está atrasada em termos do volume de capital fixo: 0,1 biliões de dólares em comparação com 0,31. Atualmente há mais cientistas e engenheiros a formarem-se na China do que nos Estados Unidos, Europa, Japão, Taiwan e Coreia do Sul juntos, e sete vezes mais do que nos Estados Unidos.

Outro exemplo é a tecnologia 5G. A China já tem 70% das estações base de telemóveis com cobertura de 5G. O Departamento de Defesa dos EUA observou que "a China está prestes a repetir com o 5G o que aconteceu com o 4G nos EUA". Nesta "quarta revolução industrial", a potência asiática assumiu a liderança no desenvolvimento da Inteligência Artificial (IA), produzindo os supercomputadores mais rápidos do mundo, chips informáticos de última geração, e alcançando marcos na criptografia quântica no campo da ciber-segurança. 

Também a indústria de semicondutores reflete os avanços da potência asiática. A estratégia industrial do Governo de Pequim — Made in China 2025 — visa produzir 70% dos semicondutores consumidos pela indústria chinesa (atualmente abaixo de 40%), para os quais serão alocados 150.000 milhões de dólares em investimentos até 2030. A perspectiva é que a China possa converter-se no segundo maior produtor de semicondutores do mundo até 2022, atrás apenas de Taiwan, ultrapassando o Japão e a Coreia do Sul. Em 1990, os EUA produziam 37% dos semicondutores do mundo, mas atualmente só 12%, abaixo dos 15% da China. Daí que a administração de Biden tenha aprovado ajudas à indústria de semicondutores em solo estado-unidense em 52.000 milhões de dólares até 2030. No entanto, de acordo com um relatório do Boston Consulting Group, abrir uma fábrica de semicondutores na China é 37% mais barato do que nos EUA5.

Em março de 2020 o Congresso Nacional do Povo da China aprovou um novo “plano quinquenal”, destinando 1,4 biliões de dólares à promoção de novos desenvolvimentos tecnológicos. Mesmo na corrida espacial a China já ultrapassou os EUA, enviando com sucesso a primeira missão ao lado oculto da lua. Segundo dados do Banco Mundial, a produção de alta tecnologia por parte da China passou de representar uns escassos 3% do mundo em 1999 para 26% em 2014, enquanto que por parte dos EUA passou de 18% para 7%. Estes dados, sem dúvida, serão muito piores para os estado-unidenses atualmente6.

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Segundo dados do Banco Mundial, a produção de alta tecnologia por parte da China passou a representar 26% em 2014, enquanto que por parte dos EUA diminuiu para 7%.

Um capitalismo de Estado muito particular

É importante lembrar que quando a burocracia stalinista chinesa empreendeu o processo de restauração capitalista estudou com muito cuidado a forma caótica em que se dissolveu a URSS. Ao contrário do que aconteceu com o PCUS, a liderança do PCC decidiu pilotar o desmantelamento da economia planeada enquanto protegia os seus interesses a todo o custo, e recorreu à manutenção de uma forte centralização e um poderoso sector estatal. O partido e o Estado continuaram fundidos, embora já como ferramentas ao serviço da acumulação capitalista.

A China beneficiou de enormes investimentos de capital ocidental ao longo da década de 1990 e no século XXI. As deslocalizações massivas de fábricas dos Estados Unidos e da Europa trouxeram uma mudança notável na divisão mundial do trabalho. Centenas de milhões de novos proletários emergiram nas cidades chinesas provenientes das zonas rurais. Baixos salários e jornadas de trabalho intermináveis foram essenciais para aumentar a competitividade das empresas ocidentais e os seus lucros. Mas este processo, que fez muito claramente avançar as forças produtivas chinesas, teve outras consequências.  

Tanto a burocracia como a burguesia chinesa aproveitaram-se de umas condições objetivas que amadureciam rapidamente para competir com as grandes potências. A grande quantidade de capital de que dispunham, graças ao superávit comercial, permitiu-lhes fazer face às necessidades de abastecimento de matérias-primas e realizar investimentos milionários em todo o mundo. A América Latina, a América Central, a África e muitos países asiáticos estão cada vez mais dependentes das compras e do crédito chineses.

Porém, até hoje, e este é um aspecto fundamental, esta nomenklatura ex-stalinista e pró-capitalista, que controla o aparelho de Estado, continua a definir a política económica e a tentar disciplinar aqueles oligarcas, obrigatoriamente filiados ao PCC, que colocam a sua autoridade e a estabilidade do sistema em risco. A burocracia e a nova burguesia formam a mesma classe dominante, mas dentro dela existem contradições evidentes e interesses divergentes que de momento se estão a resolver de maneira abrupta. A burocracia não quer abrir mão do comando, e isso faz com que os choques sejam inevitáveis.

No regime burguês o poder económico decide sobre todos os assuntos de fundo e modela o aparelho do Estado de acordo com as suas necessidades. Mas isso não exclui que em certas circunstâncias históricas de revolução e contra-revolução, a classe dominante ceda a uma casta bonapartista, militar ou fascista a gestão direta de seus interesses, incluindo os económicos, a um custo considerável.

Tal aconteceu na Alemanha nazi e na Itália fascista. Mesmo nos Estados Unidos, durante os anos do New Deal, o governo de Roosevelt teve que derrubar alguns dos grandes monopólios que pretendiam desencadear uma verdadeira guerra civil contra o movimento operário, e fê-lo para salvar a estabilidade do sistema. Com o apoio da burocracia sindical e dos stalinistas, conseguiu conter a inquietação operária daqueles anos (1934-1937) e preparar a intervenção estado-unidense na Segunda Guerra Mundial.

A diferença com a China é que o atual regime de capitalismo de Estado nasceu das mãos de uma burocracia poderosa que dirigia um Estado operário deformado, e é a mesma que se encontra à frente da administração, decide sobre as questões fundamentais do país, e embora compartilhe os lucros resultantes com a burguesia e uma crescente elite de multimilionários, têm inveja dos seus poderes e um forte instinto de autopreservação. Esta contradição objetiva ainda não foi resolvida e deve ser considerada em movimento, pois alimentará fortes conflitos no futuro.

O desmantelamento da Alibaba, uma das principais multinacionais chinesas, e o desaparecimento durante meses do seu fundador e presidente, Jack Ma, que chegou a ser o homem mais rico da China, é um claro exemplo do que dizemos. A empresa ia protagonizar a maior entrada em bolsa da história (34.500 milhões de dólares) até ser suspenso pelas autoridades chinesas. Jack Ma havia construído um império financeiro, uma verdadeira banca sombra, que poderia colocar em risco a estabilidade do país em caso de suspensão de pagamentos. Juntamente com o Alibaba, outras grandes empresas de tecnologia também foram multadas, como a Tencent ou a Didi, que cotizava em Wall Street, com base num novo regulamento "antimonopólios" aprovado em novembro de 2020. A possibilidade destas empresas se tornarem um trampolim para os interesses estado-unidenses também pesam7.

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O desmantelamento da Alibaba e o desaparecimento durante meses do seu fundador e presidente Jack Ma é um lembrete de que uma poderosa burocracia decide os assuntos fundamentais do país.

O regime chinês compreende a importância da estabilidade interna. A plutocracia cresceu muito. Bilionários como Zhong Shanshan, dono da empresa de água engarrafada Nongfu Spring, e com um património líquido de mais de 70.000 milhões de dólares, ou os nove donos das empresas automobilísticas do país que aumentaram a sua fortuna global em mais de 22.000 milhões desde julho de 2020 , ou aqueles que controlam o sector das energias renováveis, são um lembrete de que a desigualdade social explodiu.

Posto isto, quando olhamos para o gigante asiático, observamos relações entre classes que são diferentes daquelas de outras partes do mundo. A transformação sofrida nos últimos anos foi notável. Em 1990, os EUA e a Europa Ocidental compreendiam três quartos da classe média mundial, apesar de representarem um terço da população. A partir de 2018, é a China que concentra quase 50% das novas camadas médias, enquanto estas têm sofrido um processo de empobrecimento e proletarização nos países capitalistas avançados8.

Entre 2008 e 2019, o salário real duplicou na China, ao ponto de em 2016 os salários chineses excederem os dos maiores países da América Latina e alguns da UE, como a Roménia e a Bulgária. O salário médio por hora na indústria chinesa triplicou entre 2005 e 2016, chegando a 3,60 dólares. No mesmo período, a remuneração do sector industrial no Brasil caiu de 2,90 para 2,70 dólares e no México de 2,20 para 2,10 dólares9.

A lógica do “enriquecimento”, proclamada durante décadas pela liderança do PCC, espalhou-se pelo tecido social e foi transmitida à consciência de vastos sectores da população. Mas o enorme crescimento da desigualdade forçou o regime a recorrer à demagogia e à repressão na tentativa de manter uma adesão social substancial. Num discurso de 2020, o primeiro-ministro Li Keqiang afirmou que cerca de 600 milhões de pessoas vivem com um rendimento mensal de apenas 1.000 yuans (154 dólares). 

Desde que Xi Jinping chegou ao poder a recentralização económica e política aumentou consideravelmente, assim como os golpes propagandísticos de forma a manter disciplinada a nova burguesia chinesa. Numerosos empresários, todos membros do partido, foram purgados e julgados sob o pretexto de corrupção. Essas manobras foram combinadas com a intensificação do discurso nacionalista, como ocorreu na recente celebração do centenário do PCC.

Apesar do carácter autoritário do Estado, da sobreexploração da força de trabalho e da terrível destruição ambiental, o regime chinês agora desfruta de maior apoio interno do que qualquer um dos seus competidores. Isso é inegável, e ficou claro na ausência de mobilizações de solidariedade ao movimento em Hong Kong, em parte devido à política da chamada “oposição democrática” que se lançou nos braços do imperialismo, mas também por causa da resposta à pandemia e das taxas sustentadas de crescimento económico.

Mas a relativa estabilidade interna de que goza o regime chinês não impede que contradições explosivas se acumulem na base da sociedade. Apesar da melhoria formal em termos de horas, salários, pensões, etc., a sobreexploração dos trabalhadores continua a ser uma linha estratégica no processo de acumulação capitalista.

Oficialmente, a jornada de trabalho por lei é de 40 horas semanais, com no máximo 3 horas extras por dia, com limite de 9 horas extras por semana e não podendo ultrapassar 36 horas extras por mês com dois dias de folga por semana. Mas a realidade é bem diferente: todos estes limites foram ultrapassados, mas as penalidades pelas infrações são tão baixas e tão difíceis de aplicar que o direito dos trabalhadores chineses depende exclusivamente das empresas. A lei não escrita de uma jornada laboral de 9-9-6 (das 9h às 21h, seis dias por semana) é a norma num grande número de empresas e setores.

Os sindicatos oficiais (ACFTU), apesar de terem 230 milhões de filiados, dependem do regime e submetem-se às iniciativas empresariais. A China nunca ratificou as convenções internacionais sobre liberdade de associação, negociação coletiva e eliminação do trabalho forçado e a sua abolição. Oficialmente, o direito à greve foi abolido desde 1982.

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Os sindicatos oficiais (ACFTU) dependem do regime e submetem-se às iniciativas empresariais. Oficialmente, o direito à greve foi abolido desde 1982.

Mesmo assim, a luta de classes na China não desapareceu. Entre 2015 e 2018 houve uma importante escalada das lutas dos trabalhadores. Em 2016, o Ministério de Recursos Humanos e da Segurança Social da China registou 1,8 milhões de disputas laborais, um aumento de 118% em relação a 2015. Simultaneamente com a ascensão do imperialismo chinês como uma nova potência mundial, o proletariado chinês será um importante aliado na luta do proletariado mundial.

Perante a colaboração extrema da federação sindical oficial ACFTU com a classe dominante, ocorreram greves não oficiais durante este período que ultrapassaram a burocracia e mostraram um potencial revolucionário significativo. Um exemplo foi a greve dos trabalhadores da fábrica Jasic em Shenzhen em 2018, na província de Guangdong, que é considerada o modelo de capitalismo liberal e privatizações na China. A greve foi apoiada por um Comité de Solidariedade popular, cujos ativistas foram vítimas de uma dura repressão do governo, acusados pela sua orientação marxista e “maoísta”.

O recurso a levantar a bandeira do “Maoísmo”, especialmente entre setores da juventude e estudantes, também expressa de forma distorcida a procura das ideias genuínas do marxismo face à fraude ideológica do Partido Comunista oficial que encabeça o regime de capitalismo de Estado.

Mas a China não será capaz de evitar indefinidamente as convulsões sociais que sofrem as demais potências capitalistas. O caso da Rússia é ilustrativo a esse respeito. O regime de Putin beneficiou nas últimas duas décadas com o aumento dos preços das matérias-primas no mercado mundial e com a completa falta de oposição política. Mas nos últimos anos sofreu um grande desgaste como consequência da crise económica e social que atravessa o país, e o reforço da repressão não lhe deu mais apoio. As mobilizações desencadeadas após a prisão de Navalny são indicativas do crescimento do descontentamento, assim como o retrocesso do Rússia Unida nas eleições para a Duma e a ascensão do Partido Comunista. Deve-se prestar atenção especial aos desenvolvimentos políticos na Rússia no próximo período, uma vez que podem produzir grandes movimentos de massa.

Na China, os desequilíbrios económicos foram temporariamente amenizados com planos de investimento estatais sem comparação em nenhum outro país, mas a dívida pública e bancária cresce a um ritmo muito acelerado, assim como os riscos de falência de grandes empresas vinculadas ao sector imobiliário, onde a bolha especulativa está fora de controlo e pode estourar com efeitos muito negativos. Por outro lado, as obrigações que o regime imperialista de Pequim contrai todos os dias como superpotência mundial têm consequências muito claras: terá de lidar com desafios políticos e militares de grande envergadura, e as suas vantagens competitivas inevitavelmente diminuirão à medida que a recessão económica se aprofunda. 

A luta pela hegemonia intensifica-se

A batalha entre as duas grandes potências entrou numa nova fase. São precisamente as derrotas sofridas pelo imperialismo estado-unidense que levam a Casa Branca a aprofundar a luta. O que está em jogo é demasiado importante e tem implicações que afetam não apenas o poder externo dos Estados Unidos, mas o próprio futuro do capitalismo dentro de suas fronteiras. O conflito entre as duas potências pela hegemonia mundial agravar-se-á com consequências imprevisíveis para a economia, para as relações internacionais — incluindo novas guerras regionais e locais — e injetará mais combustível na luta de classes10.

O capitalismo chinês encontra-se num período de ascensão e provavelmente os efeitos da crise atual entre os seus competidores permitir-lhe-ão escalar ainda mais. Mas não está blindado. É preciso sublinhar que não estamos perante um capitalismo virtuoso capaz de superar as suas contradições. Nenhum país, nenhuma economia nacional por mais poderosa que seja, pode desvincular-se do mercado mundial e da sua crise orgânica nesta época de decadência imperialista.

Apesar do papel da China, a metástase que afeta a economia global continua a agravar-se. Como explica o marxismo, o caráter anárquico da produção capitalista dirigida pelas forças cegas do mercado e pelo desejo de lucro individual implica, mais cedo ou mais tarde, que a acumulação capitalista choque contra limites objetivos. Embora o músculo económico chinês tenha contribuído na crise de 2007-2008 para evitar um colapso completo, fê-lo através da criação de novas contradições e do aumento da sobreprodução.

As potências do G7, na sua última cimeira, emitiram um comunicado que aludia diretamente contra a China, pelos seus "subsídios industriais prejudiciais, incluindo aqueles que levam a um grave excesso de capacidade, [e] uma falta de transparência em relação ao papel do Estado na economia". A China produz atualmente 53,3% do aço mundial e 57% do alumínio mundial e, de acordo com o Ocidente, a sua política de subsídios estatais contribui para “baixar os preços, minar a rentabilidade, gerar distorções comerciais prejudiciais, criar desequilíbrios regionais e desestabilizar as relações comerciais mundiais.”11 O comunicado termina afirmando a necessidade de adotar acções contra o injusto excesso de capacidade de subsidiar, ou seja, contra a China.

Mas o que ocultam as burguesias europeia e estado-unidense é que a sobreprodução é algo generalizado por todo o mundo. A indústria mundial de aço, já afetada pelo excesso de capacidade antes da covid-19, aumentou a sua produção em 2020 em 1,5% e, no caso da China, em 5,2%. A OCDE calcula um excesso de produção em 704 milhões de toneladas, dos quais a China responde por 16%12.

A corrida entre a China e os EUA pela hegemonia económica implica que as tendências para a sobreprodução se reforçam, aumentando os desequilíbrios. Como explicou Lenin: “os capitalistas não dividem o mundo devido à sua malícia em particular, mas porque o grau de concentração alcançado os obriga a continuar por esse caminho para obter lucros; e repartem-nos proporcionalmente ao capital e à sua força, pois outro processo de distribuição é impossível no sistema de produção mercantil e capitalista”13.

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A corrida entre a China e os EUA pela hegemonia económica implica que as tendências para a sobreprodução se reforçam, aumentando os desequilíbrios.

O imperialismo chinês mostra-se cada vez mais prepotente, e com motivos para isso. Um dos resultados da crise da covid-19 é que ela põe em evidência a força da China no controlo das fontes de matérias-primas e cadeias de abastecimento14, o que está a afetar gravemente a indústria estado-unidense e europeia.

O mesmo pode ser dito em relação ao comércio internacional: em novembro do ano passado a China alcançava uma nova vitória graças ao tratado da Parceria Económica Abrangente Regional (RCEP), assinado por 15 países da região Ásia-Pacífico. Os seus membros somam mais de 2.200 milhões de habitantes, representam cerca de um terço da economia mundial e um PIB combinado de cerca de 26,2 biliões de dólares na região de maior crescimento do mundo. Uma boa resposta à guerra comercial desencadeada pelos EUA: a China já exporta mais para o Sudeste Asiático do que para os EUA ou Europa15.

Em África os investimentos chineses cresceram 43% entre 2014 e 2018, enquanto os dos Estados Unidos caíram 30,4%, os da Grã-Bretanha 26,9% e os da França 11,7%. Estamos diante de um continente chave em termos de reservas minerais e matérias-primas para o desenvolvimento de indústrias emergentes, como o carro elétrico. Uma delas é o cobalto, sendo que a República Democrática do Congo possui 52% das reservas mundiais e a China é proprietária de 50%16 das suas minas. Além disso, a potência asiática concentra mais de 80% da capacidade de refinação de cobalto.

O seu domínio sobre as matérias-primas críticas (cobalto, germânio, berílio, etc.), fundamental no desenvolvimento das indústrias emergentes de energias renováveis — a China fabrica dois terços dos painéis solares fotovoltaicos do mundo em comparação com escassos 3% dos EUA —, robótica, baterias, drones ou smartphones levaram ao domínio da Shanghai Metal Exchange sobre a London Exchange. A China é o maior produtor deste tipo de matérias-primas e também o maior importador mundial: “Mesmo quando extraem de jazigos minerais alternativos, a maior parte do processamento é feito na China antes de serem exportados novamente”, diz Hans Günter Hilpert, Diretor da Divisão de Pesquisa da Ásia no think tank alemão SWP17. Nessa mesma linha, a China tornou-se recentemente o maior refinador de petróleo do planeta, à frente dos EUA18.

Outro facto indica a profunda mudança que está a acontecer. Em 2020 a UE tornou-se o maior parceiro comercial da China, aumentando as suas exportações em 2,2% e as suas importações em 5,6%, enquanto diminuiu em relação aos EUA em 13,2% e 8,2%, respectivamente. Os comboios de carga China-UE, parte da Nova Rota da Seda, já registam mais de 40.000 viagens transportando mercadorias no valor de 200.000 milhões de dólares, cruciais na manutenção das cadeias de abastecimento durante a pandemia19.

As fusões e aquisições transfronteiriças da China, especialmente na Europa, aumentaram 268% em 2020, e lidera pela primeira vez os pedidos de patentes na Europa, à frente da Alemanha e dos Estados Unidos.

A Europa está cada vez mais encurralada entre a China e os EUA. Enquanto há 20 anos o velho continente ainda concentrava um terço da produção mundial, agora essa percentagem caiu para 15%. Daí a posição esquizofrénica dos seus dirigentes, reunindo-se com Biden para condenar a China pela sua falta de respeito pelos direitos humanos para daí a pouco se reunir com Xi Jinping e declarar que o alinhamento com os Estados Unidos contra a China “seria contraproducente”.

A tentativa dos EUA de recuperar as posições perdidas não é portanto um sonho de Trump e dos sectores de extrema-direita do Partido Republicano mas uma necessidade imperiosa da burguesia estado-unidense. Biden manteve o mesmo discurso nacionalista e a mesma hostilidade em relação à China, aprovando novas medidas como a proibição de investir em 59 empresas ligadas à indústria de defesa chinesa, entre elas a Huawei. O plano de 6 biliões de dólares anunciado pelo governo Biden, e a secção que foi aprovada com o apoio dos republicanos, que se dedica à modernização da infraestrutura dos EUA, faz parte da guerra económica20.

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A tentativa dos EUA de recuperar as posições perdidas não é portanto um sonho de Trump e dos sectores de extrema-direita do Partido Republicano mas uma necessidade imperiosa da burguesia estado-unidense.

O declínio dos EUA na qualidade das suas infraestruturas é um bom reflexo do seu declínio económico. Se em 2002 ocupava a quinta posição mundial nesse terreno, em 2019 tinha caído para a décima terceira posição, com nota C- segundo a American Society of Civil Engineers. No mesmo período, o investimento público em infraestrutura caiu de 2,7% do PIB para 0,7%. O Conselho de Relações Exteriores (CFR) assinalava num relatório de abril deste ano: “a infraestrutura dos Estados Unidos está perigosamente sobrecarregada e atrasada em relação aos seus concorrentes económicos, em particular a China”. O furacão Ida causou recentemente colapsos no sistema elétrico, como também aconteceu no Texas em fevereiro deste ano após uma tempestade de inverno sem precedentes, e os ciberataques paralisaram infraestruturas estratégicas como o Oleoduto Colonial em maio deste ano, que fornece energia à maior parte da costa leste dos EUA21.

A agressividade militar demonstrada por Biden nada tem a invejar a de Trump. A Casa Branca, liderada pelos democratas, acaba de divulgar o maior orçamento militar da história para o próximo ano: 753.000 milhões de dólares, incluindo 24.700 milhões para armas nucleares. As perspectivas não podem estar mais longe da estabilidade e da boa vizinhança. O tom é cada vez mais apocalíptico.

Em meados de setembro, a luta entre as duas grandes potências deu um novo passo em frente com a assinatura de um acordo estratégico de segurança entre os Estados Unidos, o Reino Unido e a Austrália para garantir os seus interesses na região Indo-Pacífico. O acordo incluirá planos para garantir uma maior integração nas iniciativas comuns de investigação relacionada à defesa, desenvolvimento tecnológico e industrial e, como um primeiro passo, permitirá à Austrália equipar-se com os mais modernos submarinos de propulsão nuclear. É provável que nas próximas semanas Biden tente atrair o Japão e a Índia para esta iniciativa. A recente tourné de Kamala Harris pelo Sudeste Asiático foi, sem dúvida, planeada para pavimentar o caminho nesse sentido.

 De momento, enquanto aguarda a resposta de Pequim, o primeiro grande prejudicado deste acordo foi a França, que perdeu um contrato de 50.000 milhões para renovar a frota de submarinos da Austrália. Um facto que contribui para aumentar as brechas da aliança da UE com o imperialismo estado-unidense e que elevou a tensão a níveis sem precedentes com Macron a convocar os embaixadores dos EUA e da Austrália para consulta.

 A China respondeu imediatamente, afirmando que tal acordo representa uma ameaça à sua segurança nacional. Durante o último ano aumentou de forma constante a pressão sobre a Austrália, impondo tarifas sobre indústrias chave como carvão, cevada ou vinho, e reduzindo os seus investimentos neste país em 27%. O boom económico vivido pela Austrália nas últimas décadas foi condicionado pelo aumento exponencial das suas exportações de matérias-primas e produtos para a China. Mais de 40% do seu comércio é com a China contra menos de 30% com os países da OCDE, o que coloca o Governo australiano perante graves dificuldades económicas no próximo período, que se traduzirão numa intensificação da luta de classes.

Taiwan converteu-se um foco de tensões crescentes entre os EUA e a China. O PCC aumentou a pressão sobre a “província renegada” nos últimos anos, enviando aviões de combate ao espaço aéreo taiwanês nos últimos meses e iniciando a construção de um túnel para a ilha.

Embora seja improvável um confronto militar direto com o regime fantoche dos EUA no futuro próximo, os EUA e os seus aliados podem usar a questão taiwanesa como base para uma política mais agressiva nos próximos anos, especialmente dada a importância estratégica que Taiwa e o Mar do Sul da China têm na região do Pacífico, onde os EUA aumentaram a sua presença nos últimos anos em preparação para um confronto mais direto com a China. Não se deve esquecer que Taiwan não é um país do Terceiro Mundo, mas que concentra indústrias estratégicas, especialmente na costa oeste, como a de semicondutores e importantes produtos eletrónicos, centrais para o capitalismo global e os interesses do imperialismo estadunidense.

Dívida pública, especulação e parasitismo financeiro

A profunda crise desencadeada após a eclosão da pandemia é a expressão de todas as contradições que se acumularam desde a grande recessão de 2007-2008. Naquele momento as enormes somas de dinheiro público mobilizado para salvar o capital financeiro e os grandes monopólios impediram um colapso total. Podemos dizer o mesmo agora!

A social-democracia internacional e os seus amigos da nova esquerda reformista procuram apresentar a resposta do governo em 2020 como algo radicalmente diferente de 2008. Ousam falar de um novo “paradigma”, de “medidas keynesianas” e do fim do neoliberalismo. Mas os factos concretos refutam estas afirmações. Que se tenha activado o mecanismo de layoff, os planos provisórios contra os despejos ou as ajudas diretas às famílias, completamente insuficientes, não muda o pano de fundo da estratégia da burguesia. Os mais de 12 biliões investidos pelos bancos centrais e governos capitalistas para enfrentar a depressão são um gigantesco resgate bancário e corporativo.

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A social-democracia internacional e os seus amigos da nova esquerda reformista procuram apresentar a resposta do governo em 2020 como algo radicalmente diferente de 2008.

O ano de 2020 significou um desastre económico muito mais profundo do que o experimentado em 2007-2008. As instituições capitalistas tiveram que reconhecê-lo, mas ao mesmo tempo lançaram uma vasta campanha de propaganda afirmando que se seguiria imediatamente uma recuperação em V. A realidade questionou essa montanha de mentiras.

O Banco Mundial (BM) prevê que 2021 termine com um crescimento global de 5,9%, impulsionado principalmente pela recuperação na China (8,5%) e nos EUA (6,8%). Atrás, a União Europeia com 4,2% e o Japão com uns parcos 2,9%. No entanto, o crescimento foi “3,2% abaixo das previsões pré-pandemia”. Mesmo no melhor dos casos, persistem riscos e incertezas significativas, tornando a situação económica extremamente volátil: “Uma pandemia mais persistente, uma onda de falências de empresas, tensões financeiras ou mesmo o mal-estar social podem inviabilizar o processo de recuperação”22.

Um ponto crítico são os países emergentes ou em desenvolvimento. O BM observa que “as conquistas neste grupo de economias não são suficientes para recuperar as perdas experimentadas durante a recessão de 2020 e a produção em 2022 será 4,1% inferior à prevista antes da pandemia... Para 2022, as perdas de rendimentos per capita registadas em 2020 não terão sido completamente revertidas em aproximadamente dois terços dos mercados emergentes e economias em desenvolvimento”.

Uma das razões para esta situação é o processo de vacinação desigual em todo o mundo. 80% das vacinas são monopolizadas por um punhado de países ricos. Enquanto este privilegiado clube de nações cumpriu a diretriz para 70% da população, os países mais pobres não ultrapassam os 2%23. Situação que coloca em risco a recuperação económica mundial, pela possibilidade do surgimento de mais letais e contagiosas variantes, como já aconteceu com a Delta. Embora existam os meios técnicos e científicos para acabar com a pandemia, o poder dos grandes monopólios farmacêuticos e os seus lucros estratosféricos impedem que milhões de vidas sejam salvas.

Outro fator que se está a tornar cada vez mais relevante para as condições de vida da população e da economia mundial são os efeitos devastadores das mudanças climáticas. Segundo um estudo do Swiss Re Institute, um aumento de 2 graus nas temperaturas — o suposto objetivo que o Acordo de Paris pretende evitar — significaria uma queda no PIB mundial de 11%; com um aumento de 2,6 graus a queda seria de 13,9% e se as temperaturas aumentassem 3,2 graus, o colapso do PIB mundial seria de 18,1%24.

Quando a classe dominante fala em controlar a situação, basta mencionar o crescimento da dívida pública, empresarial e familiar, para ver como mentem. Só em 2020, a dívida global aumentou mais 30 biliões de dólares, chegando a 289 biliões de dólares, 360% do PIB mundial. Este imenso peso morto colocará os governos contra as cordas no próximo período.

De acordo com dados do Instituto Internacional de Finanças (IIF)25, o aumento da dívida pública média nas economias avançadas durante a pandemia saltou de 110% para 135% do PIB. Em 2007, antes do estouro da bolha do subprime, esta representava apenas 46% do PIB. No caso das economias emergentes, os dados são igualmente preocupantes, com um aumento da dívida pública de 600 mil milhões, de 52% para 60% do PIB frente aos 28% em 200726.

Diante desta situação, o IIF alerta para a necessidade de realizar reformas fiscais e ajustes de défice, ou seja, mais cortes e austeridade, mas reconhece as sérias dificuldades que os governos podem encontrar: “Embora défices orçamentais consideráveis ​​tenham sido instrumentais para fazer face à crise, encontrar a estratégia de saída correta pode ser ainda mais difícil do que nas crises de 2008 e 2009. A pressão política ou social pode limitar os esforços dos governos para reduzir o défice e a dívida, colocando em risco a sua capacidade de enfrentar crises futuras”27.

No caso dos EUA, só a dívida empresarial atingiu 11,2 biliões de dólares, 50% do PIB, e a das famílias 14,6 biliões, correspondendo a 10 biliões em dívidas hipotecárias e quase 2 biliões em dívidas universitárias. A Federal Reserve (Fed), que injeta mensalmente 120 mil milhões de dólares na economia, duplicou a sua dívida em 2020 de 2,25 biliões de dólares para 4,59 biliões de dólares o que, a este ritmo, se prevê que chegue a quase 9 biliões de dólares no final deste ano.

Os estímulos destinados pela Fed para salvar Wall Street representaram 20% do PIB estado-unidense. A isto somam-se as leis de ajuda CARES e COVID Relief promovidas pelo governo Trump, que representavam cerca de 14% do PIB, e os novos planos aprovados pelo governo Biden, que poderão ascender aos 6 biliões de dólares. No total, o resgate da economia dos Estados Unidos, ou seja, dos grandes monopólios e do capital financeiro, chegará a 40% do PIB estado-unidense28.

O mesmo pode ser dito da UE. Somando-se o programa de compras contra a pandemia (PEPP) e outros estímulos, a dívida do BCE já ultrapassa os 7 biliões de euros. A ajuda alemã e italiana aos seus bancos e grandes empresas atingiu 30% do seu PIB; no caso do Estado espanhol uns 20%, e na França ou no Reino Unido, cerca de 15%. O Escritório de Responsabilidade Orçamental do Governo Britânico apontou que enfrentamos “o maior risco fiscal em tempos de paz [que] deixará um legado horrível para as finanças públicas”, observando que a enorme injeção de liquidez “foi quase dez vezes o nível de apoio prestado durante a crise financeira... mas a dívida pública é cerca de três vezes mais elevada do que em 2008 ”.

Na China, apesar do seu enorme músculo económico, a dívida pública, empresarial e familiar aumentou desde 2008 de 140% para 280% do PIB. Um dos principais motivos é o crescimento do chamado “shadow banking”, que hoje representa 86% do PIB chinês e 29% dos ativos bancários do país. Mas os seus concorrentes não estão muito melhores: nos Estados Unidos, a dívida global chega a 286% e na zona do Euro 283%29. De acordo com o Financial Stability Council30, no final de 2019 o shadow banking representava 49,5% do sistema financeiro mundial, com os Estados Unidos a representar 30% do mesmo31.

Esse crescimento desenfreado da dívida pública — cuja outra face são as políticas de austeridade criminosa — gerou, por sua vez, uma bolha especulativa extraordinária32. As montanhas de liquidez postas ao serviço do grande capital não levaram a nenhuma recuperação vigorosa das taxas de investimento produtivo, mas sim à colocação em circulação de um volume de capital fictício sem precedentes na história do capitalismo, que desencadeia lucros no mercado bolsista à margem das vendas reais das empresas e dá origem a outro fenómeno que já está a causar estragos: a inflação.

O próprio FMI apontava “uma divergência chocante entre os mercados financeiros e a economia real: os indicadores financeiros mostram melhores perspectivas de relançamento do que os inferidos da atividade real”. A Tesla, por exemplo, com um aumento nas receitas de 5% e dos seus fluxos de caixa de 20%, aumentou o preço das suas ações em 750%.

Nos EUA, o índice de ações S&P 500 bate recordes há meses e, no primeiro trimestre de 2021, atingiu um lucro médio por ação de empresas listadas (EPS) de 39,7 dólares, o maior da história. No terceiro trimestre, a expectativa é superá-lo, chegando aos 50 dólares por ação. Um crescimento alimentado por recompras de ações puramente especulativas. A Goldman Sachs prevê que "a recompra de 726 mil milhões de dólares em ações impulsionará o S&P 500 para 4.700 pontos"33. Após as baixas registadas em março de 2020 com a eclosão da pandemia, o S&P 500 teve uma recuperação de 100,2%, o Nasdaq de 100% e o Dow Jones de 91,6% em 2021.

Encontramo-nos diante das mesmas fórmulas da crise económica anterior, e novamente ouvimos os economistas neokeynesianos apontar a necessidade de que o crédito e essas injeções de liquidez fluam para o sector produtivo. Mas por que passar pelo processo de produção quando a política dos bancos centrais e dos governos permite obter lucros maiores, de forma simples e mais rápida por meio da especulação com dívidas, títulos ou ações?

Como Lenin explicou, na era da decadência orgânica do capitalismo “a maior parte dos lucros vão para os génios das intrigas financeiras. Essas maquinações e travessuras são baseadas na socialização da produção; mas o imenso progresso da humanidade, que levou a essa socialização... beneficia os especuladores”34.

O capital financeiro, fortalecido ainda mais pela injeção de liquidez dos bancos centrais, tornou-se mais omnipresente e parasitário, sem que nenhuma barreira se interpusesse para evitá-lo35. Um processo que ocorre paralelamente a uma concentração e monopolização de capital num grau nunca visto antes36.

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O capital financeiro, fortalecido ainda mais pela injeção de liquidez dos bancos centrais, tornou-se mais omnipresente e parasitário, sem que nenhuma barreira se interpusesse para evitá-lo.

O grande capital financeiro entrelaça-se formando um todo com o Estado burguês e com as grandes instituições financeiras, atuando como gestores e consultores da Federal Reserve ou do BCE nos seus programas de compra de ativos, um negócio chorudo do qual são juízes e parte interessada37. O Estado não vem em auxílio do capital financeiro, mas é um recurso do mesmo para acumular capital e garantir as suas taxas de lucro: “O monopólio do Estado na sociedade capitalista é apenas um meio de angariar e garantir os rendimentos dos milionários à beira da falência neste ou naquele sector”38.

A orgia especulativa impulsiona a inflação em muitos sectores. A existência de centenas de milhares de milhões de dólares ociosos que não são destinados à atividade produtiva pressiona os sectores onde a procura é garantida. É o que acontece no sector imobiliário, onde grandes fundos de investimento e bancos dominam o mercado de arrendamento e os imóveis, causando aumentos permanentes. Ou com a eletricidade, cujos preços disparam não por causa do aumento dos custos de produção, mas por causa do controlo monopolista do sector após décadas de privatização de um serviço fundamental. O mesmo acontece em outros sectores, como empresas de gás ou agroalimentares, ou educação e saúde. 

A ameaça de estagflação (estagnação mais inflação) não é uma hipótese distante, ela já está a bater à porta da economia global. Nos EUA, os preços subiram para 5,4%, a maior taxa em 29 anos. Na China, a inflação industrial bateu um novo recorde de 9% em julho, o maior em mais de uma década, e pode levar a um aumento geral dos preços em todo o mundo. No caso da UE, a inflação situou-se em 2,2% em julho, a maior desde 2018.

Nesta dinâmica, o aumento do preço dos alimentos tem enormes consequências sociais. A FAO destaca que de maio de 2020 a maio de 2021 o aumento dos preços dos alimentos foi de 39,7%, o maior desde que começou a ser registado. Os cereais subiram 36,6%; óleo vegetal, 124%; laticínios, 28%; carne 10% e açúcar 57%. O índice de preços de alimentos da FAO situou-se em 127,4 pontos em agosto, próximo do seu nível recorde (137,6), alcançado em 2011, e que foi um dos impulsionadores da eclosão da Primavera Árabe.

O FMI assinalou que os preços podem continuar a subir até aos 25%, o que junto com a catástrofe da Covid causará uma nova epidemia de fome no mundo. O último relatório das Nações Unidas indica que o número de pessoas que sofrerão diretamente com isso aumentou de 650 milhões em 2019 para 811 milhões no final de 2020 (10% da população mundial), aumentando para 21% no caso da África. 2.300 milhões de pessoas terão insegurança alimentar, 30% da população mundial!

Muitos meios de comunicação apontam os desastres ecológicos como a causa destes aumentos. Obviamente, um dos motivos do combate às alterações climáticas é preservar a fertilidade da terra e garantir uma produção sustentável de alimentos que permita a alimentação de toda a população. No entanto, esta abordagem esconde que o problema fundamental não são as alterações climáticas, mas a especulação e o próprio modo de produção capitalista. O trabalho mais recente neste sentido pelo World Wide Fund for Nature (WWF) e Tesco39 indica que 40% da produção mundial de alimentos, 2,5 mil milhões de toneladas, é desperdiçada. Essas perdas são maiores nos países industrializados, responsáveis ​​por 58% do total. Se não houver lucro, os capitalistas preferem que os produtos apodreçam.

Interrupção da cadeia de mercadorias e “desabastecimento”

Outro aspecto relevante do momento atual é a subida dos preços das matérias-primas, petróleo, gás, aço, cobre, alumínio e outras matérias-primas indispensáveis à produção industrial, como os semicondutores. O Banco Mundial assinala que os preços duplicaram e triplicaram, atingindo em alguns casos os níveis previstos para o ano de 2035 (desde janeiro, o preço do Brent bateu o seu máximo de três anos, chegando a 83,67 dólares por barril).

As tensões inflacionárias devem-se a uma combinação de fatores: especulação financeira que desvia grandes fluxos de capital para as empresas monopolistas de energia e que é retroalimentado por planos de resgate e “estímulo” dos bancos centrais; o aumento significativo na procura por bens de consumo após o colapso sofrido durante a pandemia; o açambarcamento de produtos e contentores pelas grandes multinacionais para aumentar a sua taxa de lucro durante esta recuperação global. Além disso, as altas tarifas que a guerra comercial entre os EUA e a China incentiva e a decisão do governo de Beijing de reter matérias-primas essenciais para blindar o seu tecido industrial e comercial alimentam a espiral de preços.

Nos últimos meses, tem havido uma pressão colossal na cadeia de abastecimento, por sua vez condicionada por uma organização just in time, após anos de globalização económica e socialização da produção a uma escala sem precedentes. E isso teve consequências óbvias, tornando extremamente difícil repor os stocks ao ritmo que a procura exige. A produção de componentes industriais de todos os tipos, semicondutores, matérias-primas, etc.; cruciais para a indústria automóvel, máquinas-ferramenta, linha branca e eletrónica (consolas, computadores, telemóveis de última geração...) foram severamente afetadas, causando escassez temporária e meses de espera para muitos destes produtos serem entregues40.

As vantagens da globalização também mostram os seus limites. As novas tecnologias de comunicação e o desenvolvimento exponencial do comércio pela Internet, juntamente com os meios de transporte mais baratos, geraram uma autêntica revolução com a formação de cadeias globais de valor, que agora são afetadas pela gigantesca distâncias que tanto os componentes como as mercadorias têm que percorrer para chegar às fábricas e pontos de venda.

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É preciso destacar que esta retoma do consumo não podemos considerá-lo uma tendência fundamental, nem mesmo sustentável a médio prazo, que permita superar o longo período de estagnação capitalista.

Em todo caso, é preciso destacar que esta retoma do consumo, que propiciou uma campanha histérica sobre a suposta hecatombe do desabastecimento que poderia ocorrer nas compras de natal, atinge setores da sociedade com forte poder de compra, principalmente as classes médias que concentram a maior parte da poupança disponível. Mas não podemos considerá-lo uma tendência fundamental, nem mesmo sustentável a médio prazo, que permita superar o longo período de estagnação capitalista.

Conforme indicado no último relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) publicado a 8 de novembro, durante a primavera houve um colapso geral do rendimento familiar, apesar do aumento do Produto Interno Bruto (PIB). Segundo o estudo, nos países que compõem a OCDE, a queda foi de 3,8%, sendo que os estadunidenses lideram a queda do rendimento per capita com uma queda de 8,35% (noutros países a queda também foi importante: Grécia -4%, Hungria -2,7%, Holanda -2,1%, Irlanda -1,4% e o Estado espanhol -1,17%)41.

 

1. François Chesnais, La originalidad absoluta de la crisis sanitaria y económica mundial (alencontre.org, bit.ly/39moBcz).

2. Em janeiro de 2021 ocorreu um primeiro surto, que terminou com apenas 2.000 infecções, causando a primeira morte por covid-19 desde 17 de maio de 2020. A 7 de janeiro de 2021, a cidade chinesa de Shijiazhuang, com 11 milhões de habitantes, entrou em quarentena após a deteção de 117 infecções. Nas primeiras 24 horas, foram realizados mais de 6 milhões de PCRs e 40% deles analisados, as aulas foram suspensas e as estações de comboios, autocarros e aeroporto foram fechados.

3. China deja atrás a Occidente en la cuarta revolución industrial (lavanguardia.com, bit.ly/3EFFDAD).

4. Pandemia en la India: caos, devastación y barbarie capitalista (bit.ly/3ikNDxF).

5. Assim refletia o Atlantic Council (um think tank estado-unidense fundado em 1961) sobre a crise do mercado de semicondutores num dos seus últimos relatórios: “A recente escassez de semicondutores foi uma chamada de atenção para a economia estado-unidense, já que os legisladores se aperceberam que cerca de 75% da produção global de semicondutores ocorre na China e nalgumas outras economias do Leste Asiático. Para além disso, mais de 90% da capacidade de produção mais avançada de semicondutores do mundo encontra-se numa única economia, Taiwan, cuja soberania é frequentemente ameaçada pela China. Isto encorajou a União Europeia e os Estados Unidos a considerarem seriamente a expansão das suas capacidades de fabrico de semicondutores. Um relatório do Boston Consulting Group destaca a necessidade de incentivos do governo para promover o investimento privado na indústria de semicondutores. O relatório estima que 50.000 milhões de dólares em programas de incentivos financiados pelo governo nos próximos dez anos seriam um bom ponto de partida para o governo dos Estados Unidos restabelecer gradualmente o país como um lugar atraente para a produção avançada de semicondutores” (atlanticcouncil.org, bit.ly/3lMBLoL).

6. China deja atrás a Occidente en la cuarta revolución industrial (lavanguardia.com, bit.ly/3EFFDAD).

7. Assim o explicava um analista ligado ao governo chinês no Global Times: “O Estado não pode permitir que [as empresas de tecnologia] se convertam em legisladores na recolha e uso de informações pessoais. Os standards devem estar nas mãos do Estado para garantir que esses gigantes sejam moderados na recolha de informações pessoais. Especialmente em relação a empresas como a Didi Chuxing, que fazem parte da bolsa dos Estados Unidos, e cujos primeiro e segundo acionistas são empresas estrangeiras, o país precisa de ter uma estrita supervisão de segurança da informação tanto para manter a segurança da informação pessoal quanto para manter a Segurança Nacional” (Xataka.com, bit.ly/3hQvkzY).

8. China ya concentra la mitad de la clase media mundial (lavanguardia.com, bit.ly/3krx3gP).

9. Todos os dados sobre salários provêm do Global Wage Report 2018-2019 da Organização Internacional do Trabalho (bit.ly/3zREjXL).

10. “A imobiliária mais endividada do mundo, a chinesa Evergrande, que se está a desmoronar, é a firma mais endividada do sector em todo o mundo, com encargos de 305.000 milhões de dólares, e atravessa sérias dificuldades para lhes fazer frente. Entre a apreensão de uma falência que pode arrastar o sector e ter sérias consequências para a economia chinesa — a construção civil é um dos seus pilares — esta semana já viu dois cortes consecutivos no rating da sua dívida (...) A empresa perdeu cerca de 70% do seu valor até agora este ano. Em agosto, os seus contratos de venda — inclusivamente de ativos oferecidos como pagamento aos seus fornecedores — caíram 26% em relação ao mesmo mês do ano passado (...) Uma das grandes dúvidas em relação à situação do sector imobiliário é como vai responder o governo chinês. Se vem em seu socorro, dada a dimensão da empresa e o possível 'efeito de contágio', ou se optará por abandonar à sua sorte um grupo que, nas palavras da consultoria Eurasia Group, é 'o notório exemplo de uma gestão irresponsável da dívida e má conduta no mercado imobiliário'…” (elpais.com, bit.ly/3zrEyZE).

11. G7 criticizes subsidies driving overcapacity in steel, aluminium (metalbulletin.com, bit.ly/3EvmG3A).

12. Pandemia ocasiona sobreproducción de acero en el mundo (arcus-global.com, bit.ly/3hNxWwPd).

13. O imperialismo, fase superior do capitalismo, V. I. Lenin, edição da Fundación Federico Engels, p. 115.

14. A Casa Branca publicou um relatório contundente sobre a debilidade das cadeias de fornecimento para os EUA (whitehouse.gov, bit.ly/3AvkhDA).

15. El Sudeste Asiático se convierte en el mayor socio comercial de China (lavanguardia.com, bit.ly/3kr8cK8).

16. De acordo com o US Office of Energy Efficiency & Renewable Energy o cobalto tem o maior risco de cadeia de fornecimento de material para as baterias de lítio e veículos elétricos nos Estados Unidos (atlanticocouncil.org, bit.ly/3lMBLoL).

17. Cómo la minería china domina el mercado de las materias primas críticas (dw.com, bit.ly/3tXDNpP).

18. China supera a Estados Unidos y se convierte en el mayor refinador del mundo (worldenergytrade.com, bit.ly/3koacmq).

19. La nueva Ruta de la Seda china acaba en Duisburgo (cincodias.elpais.com, bit.ly/2XvlpbQ).

20. China y Estados Unidos: el multimillonario plan de Washington para competir con el gigante asiático en el campo de la tecnología (y por qué Pekín lo considera un “delirio paranoide”) (bbc.com, bbc.in/2VWf0WE).

21. · El plan de infraestructuras de Biden: qué, cómo, por qué y contra quién (blog.realinstitutoelcano.org, bit.ly/3lIBHGO). · Foreign Direct Investment: A new strategy for the Uni- ted States (atlanticcouncil.org, bit.ly/3lMBLoL).

22. La economía mundial: en camino hacia un crecimiento firme, aunque desigual debido a los efectos perdurables de la covid-19 (bancomundial.org, bit.ly/3nX1kX1).

23. Na Ásia, o continente mais populoso do mundo, todo o processo de vacinação, à excepção da China, está a ser muito lento. A Índia administrou o esquema completo de vacinação a apenas a 10,1% da sua população, a Tailândia a 11,2% e a Indonésia a 13,1%. Na América Latina, o México e o Brasil, os países mais populosos do continente, administraram o esquema completo a apenas 26,3% e 28,9% da população, respectivamente. No caso da África, a situação é dramática, apenas 1,8% da população tem o esquema completo.

24. This is how climate change could impact the global economy (weforum.org, bit.ly/3CxMBG5). Esta mesma instituição calcula que apenas as perdas causadas por catástrofes naturais no primeiro semestre do ano, excluindo as catástrofes que vivemos neste verão, atingiram o recorde de 42.000 milhões de dólares (swissre.com, bit.ly/3ks5K6j).

25. Patronal global da banca.

26. La deuda mundial cae ligeramente tras dos años y medio de escalada ininterrumpida (elpais.com, bit.ly/3EGtFHg).

27. La deuda global alcanza un nuevo récord por el impacto de la pandemia (elpais.com, bit.ly/3AysW8o).

28. El problema del rescate del neoliberalismo (ctxt.es, bit.ly/ 3hQk1aU).

29. ¿Quo vadis, deuda de China? (caixabankresearch.com, bit.ly/3hVkf0z).

30. Organização internacional que visa a eficiência e estabilidade do sistema financeiro internacional. Foi criada após a Cimeira do G20 em Londres como sucessor do Fórum de Estabilidade Financeira.

31. Global Monitoring Report on Non-Bank Financial Intermediation 2020 (fsb.org, bit.ly/3tYaWBJ).

32. Os Collateralized loan obligations (CLOs), semelhantes a subprime e Collateralized Debt Obligation (CDOs), que desencadearam a crise financeira em 2007, aumentaram para um bilião de dólares (700.000 milhões nas mãos de entidades financeiras estado-unidenses). A própria UE está a promover alterações legislativas com vista à criação de um mercado de créditos de liquidação duvidosa, que com a pandemia poderá atingir um total de 1,4 biliões de euros em 2022: “O objetivo da nova regulamentação é apoiar o desenvolvimento do mercado secundário para créditos de liquidação duvidosa na UE, a fim de permitir que os bancos limpem as suas contas de 'empréstimos malparados', garantindo ao mesmo tempo que a venda não afete os direitos de quem os pediu”.

33. La recompra de 726.000 millones de dólares en acciones impulsará al S&P 500 hasta los 4.700 puntos (eleconomista.es, bit.ly/3Ex3LFL).

34. O imperialismo, fase superior do capitalismo, V. I. Lenin, edição da Fundación Federico Engels, p. 49.

35. O maior gestor de fundos de investimento do mundo, Blackrock, aumentou a sua riqueza durante a pandemia em 1,2 biliões de dólares para alcançar o valor recorde de 9,5 biliões de dólares, atrás apenas do PIB dos Estados Unidos e da China. O fundo tem o seu próprio software de análise de risco, chamado Aladdin, que administra ativos de mais de 21,6 biliões. Os três maiores fundos de investimento do mundo, Blackrock, Vanguard e State Street, controlam 20% de Wall Street e são os maiores acionistas de 40% de todas as empresas estado-unidenses. Também possuem 20,16% da Pfizer e 21,23% da Johnson & Johnson; A Blackrock é a principal acionista da AstraZeneca com 7,69%.

36. A revista Nature, num recente estudo sobre alterações climáticas, confirmou até que ponto os recursos naturais do planeta, a produção agrícola, mineral, farmacêutica ou de qualquer outro sector, estão concentrados nas mãos de um minúsculo punhado de grandes monopólios: quatro multinacionais controlam 84% do mercado de pesticidas, dez 56% do mercado de fertilizantes, outros dez 83% da farmacêutica para pecuária e apenas três empresas 60% do mercado de sementes. No sector de mineração, cinco multinacionais correspondem a 91%, 88% e 62% da produção mundial de platina, paládio e cobalto, e dez multinacionais 64%, 52%, 50% e 45% da produção de níquel, ferro, cobre e zinco, respectivamente, além de 34% e 30% da prata e ouro. 72% das reservas de petróleo e 51% das reservas de gás estão nas mãos de uma dezena de empresas multinacionais, enquanto outras tantas produzem 30% do cimento mundial. Também há dez que respondem por 25% da produção mundial de papel e papelão, e treze que respondem por entre 11% a 16% da pesca mundial e entre 20% a 40% dos recursos pesqueiros. Cinco multinacionais controlam 90% do comércio mundial de óleo de palma, outras três 60% da produção de cacau, dez 40% da produção de café, oito 54% da produção de soja, três 42% da produção de banana e cinco 48% da produção de salmão.

37. Em 2020, a Comissão Europeia escolheu a BlackRock como principal assessora na incorporação de critérios “verdes e sociais” nas finanças, ou seja, para desempenhar um papel decisivo na distribuição dos fundos europeus.

38. O imperialismo, fase superior do capitalismo, V. I. Lenin, edição da Fundación Federico Engels, p. 65.

39. Driven to waste: The global impact of food loss and waste on farms (WWF, bit.ly/3CwC91v).

40. A um forte aumento da procura sucede-se inevitavelmente um forte aumento dos preços, exacerbado também pelo controlo monopolista de setores-chave para o comércio mundial. O caso do transporte marítimo é muito relevante. 80% das mercadorias consumidas no mundo chegam ao destino por via marítima. E cinco empresas de navegação respondem por 65% do mercado de navios porta-contentores. A líder é a Maersk, com 17% da quota e capacidade para transportar 4.247.540 contentores a bordo dos seus 731 navios, aos quais agregará mais 26 nos próximos anos (https://www.lavanguardia.com/economia/20211031/7829022/comercio-mundial-duenos-navieras-portacontenderos-crisis.html). O crescimento dos preços dos contentores está relacionado com esse controlo do monopólio e ao rápido aumento da procura: de acordo com relatórios do Container Trades Statistics, os embarques comerciais da Ásia para os EUA em janeiro-agosto de 2021 foram 25% maiores em relação ao mesmo período de 2019. Também a capacidade de desembarcar mercadorias nos principais portos do mundo tem sido limitada pelas contínuas reconversões que têm implicado o despedimento de milhares de estivadores e na adaptação do descarregamento às exigências do just in time e redução de custos. A capacidade de lidar com situações extraordinárias como a que vivemos agora foi significativamente reduzida, o que explica as imagens de dezenas de navios porta-contentores em fila nos portos de São Francisco e Singapura. O mesmo pode ser dito em relação ao transporte rodoviário, onde o retrocesso nas condições de trabalho e a sobreexploração conduziram a um envelhecimento e a uma escassez de mão-de-obra que agora pesa negativamente.

41. De acordo com o inquérito ao consumidor da Comissão Europeia (CE), os 600.000 milhões de euros 'retidos' pelas famílias em 2020 estão desigualmente distribuídos, tanto em termos de rendimento como de idade. Esta desigualdade impedirá que a torneira do consumo abra com a força esperada: “Os consumidores dos quartis superiores experimentaram grandes aumentos na poupança, o que sugere que os seus níveis de rendimento foram amplamente protegidos, enquanto o consumo caiu devido a menos oportunidades de gastar devido às restrições. Pelo contrário, os que se encontram nos quartis de rendimento mais baixo experimentaram apenas um aumento muito limitado nas suas economias”.

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